25.8.05

A MÃO ESQUERDA DE DEUS

De acordo com alguma imprensa, Mário Soares porá termo à farsa da "reflexão" já na próxima semana. Entre aqueles que o ajudaram a alimentá-la encontram-se - segundo o próprio - governadores civis. Como toda a gente sabe, os governadores civis são uma espécie de longa manus do governo nos distritos. No caso de possuírem alguma habilidade e um módico de subtileza política, podem igualmente servir de "cabos" eleitorais. Em suma, a natureza político-partidária da sua nomeação recomenda-os numa campanha eleitoral a disputar com cuidado. Soares não perde tempo com minudências e quer, naturalmente, uma campanha "oficiosa" como candidato do "regime". Daí os jantares e as conversas intimidatórias com as pobres criaturas. E é precisamente aqui que começa a principal diferença de Soares 2005/2006 com Soares 1985/1986. Há vinte anos, a candidatura de Soares tinha o travo da "resistência" moderada à esquerda e à direita "oficiosas", representadas respectivamente no voluntarismo "esclarecido" de Pintasilgo, no ressentimente fraticida de Zenha e na fragilidade "governamentalista" de Freitas do Amaral. Se dependesse dos dois primeiros, Soares não teria saído do Campo Grande. Quando dependeu de Freitas do Amaral e da sua "aposta" em "puxar" Soares contra Zenha para a 2ª volta, Soares ganhou. E ganhou, apesar da maioria "cavaquista" que já nessa altura se começava a desenhar. Hoje Soares parte "colado" à actual maioria partidária de governo, que está longe de corresponder à maioria "eleitoral" que deu a vitória ao PS em Fevereiro. Será também e a seu tempo, o candidato oficial das restantes "esquerdas" para esconjurar o diabo, uma contabilidade mesquinha que até inclui a eventualidade de um "Le Penzito" português para "animar". O que é que de verdadeiramente "novo" têm Soares e os seus provisórios compagnons de route (Jerónimo de Sousa e o do BE) a propôr a um país em crise e às mais jovens gerações? Soares, na realidade, não propôe nada, nem lhe interessa minimamente propôr. Limita-se a impôr a sua veneranda pessoa ao PS e às "esquerdas" em nome de um combate ideológico que dissimuladamente diz não ter lugar. Acontece que, nesse "combate" que é bom que exista, o lugar do "moderado" de 1985/1986 será ocupado por Cavaco Silva. Às vezes a "mão esquerda de Deus" escreve "direito" por linhas tortas. Caberá a Cavaco Silva a meritória tarefa de provar que a democracia não tem donos nem direitos de exclusividade. Que não lhe doa a mão e votos não lhe hão-de faltar.

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