O FILHO DA MÃE
Há, em Portugal, a insuportável mania de associar o comportamento de uma determinada pessoa à circunstância de ser pai, filho, primo, amante, mulher ou marido de a, b ou c. Para o tabloidismo vigente, o que conta não é a insignificância ou a gravidade do comportamento, mas antes a relação familiar ou outra que possa unir o visado a uma determinada figura pública. O caso mais extraordinário passou-se com o "processo Casa Pia", em que praticamente todo o país era suspeito, em virtude de quase toda a gente estar ligada a quase toda a gente, fosse lá por que fosse. Agora, numa acção policial perfeitamente rotineira de combate ao tráfico de estupefacientes, foram detidos não sei quantos indivíduos anódinos. De entre eles, o cidadão Miguel Beleza mereceu a distinção dos tablóides, não em virtude de ser suspeito de ter cometido um delito do foro criminal, como todos os outros cujos nomes e formas de vida ignoramos, mas por ser filho "daquela" mãe, Leonor Beleza. A relação filial, julgo eu, é completamente irrelevante para a caracterização do suposto delito. Porém é essa "verdade" que interessa exclusivamente "passar". Não há nenhum "facto político" nesta detenção para além da forma insinuosa como é divulgada. Esta mentalidade vulgar de porteira intriguista (com o devido respeito pela função das porteiras) que os jornais e as televisões exploram à exaustão, babando-se de gozo incontido, é apenas mais uma imitação grosseira de maus hábitos importados, sem respeito nenhum pela intimidade e pela infelicidade alheias.
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