O CADÁVER EM FÉRIAS
No jantar que antecedeu a cimeira da NATO, em Istambul, Durão Barroso passeava-se já entre os grandes deste mundo como se fosse genuinamente um deles. Deve olhar com desprezo e comiseração para a telenovela doméstica que ele mesmo engendrou. Para quê- pensará- preocupar-me com ninharias e gente pequenina se posso ser um arremedo de "poderoso"? Por isso só falará quando bem entender. Decididamente o seu reino não é mais o deste nosso mísero canto. Percebe-se porquê. Contudo, da cabeça de Barroso à realidade circundante ainda vai uma razoável distância. Basta percorrer a imprensa internacional para se perceber que o homem não foi escolhido pelos seus específicos méritos. A UE é um compromisso permanente e volátil em que Barroso conta apenas como peça menor. A indulgência e a vontade dos que verdadeiramente mandam, permitiram esta sua repentina ascese europeia, uma saída mais do que airosa para o previsível impasse da sua coligação de governo em crescente declínio. A Itália não foi particularmente beneficiada com a estadia do Sr. Prodi em Bruxelas, da mesma forma que, descontando o parolismo provinciano que se revê deliciado na prebenda europeia, Portugal o não será por lá ter um dos seus. Compreende-se que, num momento em que chega ao fim o Euro 2004, e em que o "desígnio nacional" termina, o mais tardar, no fim de semana, seja necessário agarrar um novo. Sucede que a deriva europeia de Barroso diz muito pouco ao comum português, mais legitimamente preocupado com as "suas coisinhas". Longe vai o "confiem em mim" do congresso do PSD ou o "manter o mesmo rumo" da noite das eleições europeias. Barroso fez literalmente tábua-rasa de si próprio e da sua "confiança". E não nos avisou. Nestes precisos termos, a "estabilidade" por que reclamam ele, o Dr. Sampaio, o Dr. Telmo e o Dr. Santana, acabou. O que se vai passar nos próximos dias é a pura demonstração de que ela, a "estabilidade", não passa de um cadáver em férias.
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