LIBERDADE II
Acabo de ver e de ouvir o discurso do Chefe do Estado alusivo aos 30 anos do 25 de Abril. Nem que de propósito, e depois de Jorge Sampaio ter criticado a apatia cívica, a subserviência que persiste nos costumes e a desqualificação nacional, uma rápida passagem pelas aberturas dos telejornais da hora de almoço das quatro TV´s revela-nos bem o ponto em que efectivamente estamos. Corridas de automóvel, num lado, futebol, nos outros, e, muito especialmente, Futebol Clube do Porto em todos. A "valentim-loureirização" ou, em versão hard, a "pinto-da-costização" da vida pública nacional, é o duro preço que há que pagar relativo aos chamados efeitos perversos da democracia. Infelizmente, o "pacote" democrático arrebatado com cravos e sem sangue naquela madrugada de Abril de 1974, inclui tudo isto. O que significa que, ao contrário do que proclama a absurda propaganda da "evolução", evoluímos, em muitos aspectos, muito pouco. Na campa rasa do Vimieiro, Salazar deve rebolar-se de gozo. Nos 30 anos de Abril, são o fado (o hino cantado pela fadista de serviço) e o futebol que imperam. Apesar desta choldrice fandanga em que estamos enterrados, sabe-me bem recordar hoje dois ou três nomes sem os quais nem o melhor nem o pior de nós mesmos poderia jamais ter saltado cá para fora. O "dia inicial inteiro e limpo" confunde-se com Otelo Saraiva de Carvalho e Salgueiro Maia, e é no rosto desse "democrata obstinado" que é Mário Soares, como lhe chamava ontem o Le Monde, que eu gosto de rever a minha liberdade. O resto é paisagem.
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