11.3.04

QUESTÃO DE "CABEÇAS"

Cerca de dois mil cientistas e investigadores franceses apresentaram simultaneamente a demissão. Protestam contra os cortes orçamentais para o sector e reclamam, do governo e do Presidente da República, um sinal de que a investigação científica não vai correr perigo por causa da "intendência". Pertencem aos diferentes níveis das respectivas "cadeias" hierárquicas, ou seja, não são apenas os pieds noirs da investigação gaulesa quem se incomoda. Esta situação, aparentemente constrangedora para a pátria das Luzes, seria impossível por cá, por diversas razões. Desde logo, porque não temos propriamente uma tradição robusta em matéria de investigação científica e tecnológica. O que há é frágil, pequenino e muitas das vezes "a leste" da realidade "nacional" que supostamente deve servir. O francamente "bom", tende, assim que pode, a escapulir-se para fora e por lá fica a medrar. Os governos, todos, incorporam num ministério a investigação científica, mais como uma "flor na lapela" do que qualquer outra coisa. A mais recente excepção foi, no consulado de Guterres, Mariano Gago. Se a "intendência" é má para a investigação em França, imagine-se o que não será aqui, particularmente nestes tempos de feroz contagem das décimas. Finalmente, há a questão da atitude "cívica". É inimaginável vermos os nossos investigadores, ou outra "classe" qualquer, e os seus dirigentes, a "baterem com a porta" desta forma. A inveja, o ciúme, o ressentimento, o egoísmo, enfim, a infinita "dor de cotovelo" nacional, de mão dada com o proverbial "respeitinho", impedem qualquer extravagância deste género. E, depois, a qualificação, não sendo para nós uma prioridade política, nada pode dizer ao cidadão comum. Entre a bola, o betão, o jet set e a Casa Pia, de um lado, e "maçadas", do outro, não há que hesitar. Tudo, em França como aqui, se resume, afinal, a uma "questão de cabeças".

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