19.3.04

O SÍNDROME DA MOCHILA

Dei-me ao trabalho de assistir à entrevista que o primeiro-ministro deu na televisão pública. Ao contrário do que é costume - refiro-me à sua imagem de "resistente" -, achei Durão Barroso cansado. De tal forma que, em determinada altura, eu próprio "passei pelas brasas". Escusado será dizer que a mensagem do chefe do Governo não se afastou praticamente nada do que tem sido o seu "discurso" oficial, um discurso que, segundo as últimas sondagens, não convence ninguém. Só em dois momentos me pareceu que Barroso "variou", no bom sentido. O primeiro, quando esclareceu com alguma firmeza que a escolha do apoio do PSD a um candidato presidencial dependia exclusivamente dele, e que este não era o momento para fazer isso. O segundo, quando pediu aos órgãos de comunicação social que não entrassem numa espiral alarmista em relação ao problema do terrorismo. Julgo que o Presidente da República também apelou no mesmo sentido. Ainda bem. Depois do frenesim da pedofilia, seria inconcebível que as câmaras da televisão se virassem agora para a primeira mochila ou para o primeiro pacote largados nos bancos de um jardim. A mitomania portuguesa e a paranóia habitual tenderão, nos próximos tempos, a ver uma bomba em qualquer objecto nitidamente não identificado. É sobretudo fundamental que, por causa da mochila às costas, da cor da pele, da origem geográfica ou da peça de roupa, se não instale o mínimo clima de suspeição e de discriminação na sociedade portuguesa. A garantia da segurança dos bens e das pessoas não pode, sobre nenhum pretexto, dar azo a qualquer deriva securitária que menorize ainda mais a nossa tão apoucada cidadania. É bom que não se explore este "síndrome da mochila" e que se mantenha, nesta matéria, algum realismo político e um infinito bom senso.

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