17.6.07

O "MEDO DAS REPRESÁLIAS"


No Sol, Margarida Marante - que, parece, finalmente trocou as trevas brancas por um módico de bom senso - entrevista o sr. Van Zeller, o homem da CIP. Não li, mas registei que o garboso empreendedorismo nacional tem medo das represálias do governo. Isto por causa da Ota, quando não, por causa de tudo. Sempre achei que a sociedade civil portuguesa era um mito e que, tirando Belmiro de Azevedo, toda essa gente é "comprometida". Falam, esbracejam, vociferam contra a longa manus do Estado, dizem-se "liberais", mas têm medo. Ora quem tem medo compra um cão, e não se dedica nem à indústria, nem ao comércio. Mais avisados andam aqueles liberais dos "serviços" porque chegam mais depressa e melhor a bom porto que os outros. Este fim de semana participei, em Ofir, num seminário sobre o putativo novo código dos contratos públicos. Deram-me a ler uma versão, mas consta que existem várias. Para quem estudou e gosta de direito administrativo, este "código" é uma indignidade parida num dos tais escritórios de advogados que servem de direcção-geral paralela a qualquer governo. A promiscuidade e a falta de vergonha já vão ao ponto de um ilustre administrativista português (Mário Esteves de Oliveira) ter falado ontem de manhã no "estigma do interesse público". Ou seja, na opinião dele, este "código" - todo ele pensado para a facilitação, para a corrupção, para as Otas e para os TGV's (não há que ter medo das palavras, como não tiveram a Maria João Estorninho e o Vasco Pereira da Silva) - que, em termos de pura técnica legislativa, é um trambolho, corresponde a dar vazão aos princípios da livre concorrência e da economia aberta, comunitários e constitucionais. Até aqui, estamos de acordo. Acontece que o código vai aplicar-se a Portugal, ao esterco que é a economia portuguesa e ao bando de marionetas que é o seu "tecido" empresarial, sempre com "medo das represálias". É um código de contratos públicos escrito e escarrado para contornar o "estigma" do interesse público, para, como diria um "liberal", servir o "mercado" que, por sinal, não funciona sem a mãozinha estatal. Ensinaram-me outras coisas na faculdade e, felizmente, verifiquei que, na "doutrina", ainda há quem ensine o que é o "interesse público" sem recurso à psicanálise ou a outro género de "interesses". O "blairismo" está presente no código na risível figura jurídica do "diálogo negocial". E na "agilização" dos procedimentos encomendada a preceito aos ilustres juristas das tais direcções-gerais paralelas. Por isso, este futuro código da contratação pública é um assunto a seguir e não um mero exercício onanista de cultores do direito administrativo. À sombra da transposição de Directivas comunitárias de 2004, prepara-se o pior. Basta ler no portal do governo as intervenções de vários ministros sobre o assunto, a começar pelo sempre engenhoso Mário Lino. Cheira-me que a PJ e os tribunais - os criminais, naturalmente - vão ter mais trabalho do que a justiça administrativa.

Adenda: O José Pacheco Pereira, nos intervalos entre aqueles doces "momentos em tempo real" e os "early morning blogs" e tretas afins, acerta quase sempre na mouche. E envio-lhe o post por mail apesar de saber que V. não lhe liga peva.

"O presidente da confederação patronal CIP esclarece que a razão por que os financiadores de um estudo sobre a localização de um aeroporto, - a que o Presidente da República concedeu uma caução recebendo-o em mão e que motivou uma inversão de 180º numa política governamental fixada por um "nunca", - querem permanecer anónimos, é "com medo de retaliações por parte do Governo" em "contratos, concessões, concursos" (cito o Sol). Passaram 24 horas sobre estas palavras , e nem o Governo nem o PS entenderam indignar-se, protestar, negar, tais afirmações, nem que fosse retoricamente. Ou acham que não vale a pena, por indiferença pela acusação, ou querem matá-la pelo silêncio e pelo esquecimento. Este silêncio é bem típico dos tempos, mas não devia ser permitido nem pela oposição nem pela opinião pública. Valia a pena perguntar ao Primeiro-ministro no parlamento, o primeiro sítio onde se devem fazer estas perguntas, se ele não acha que "quem cala consente", e se não tem nada a dizer sobre o clima pouco sadio que se está a instalar em Portugal.

[ADENDA: Tudo isto parece cada vez mais estranho. A pessoa que gostaria de ver bem longe desta confusão é o Presidente da República, mas, a não haver um esclarecimento rápido de todo este processo, ele também fica envolvido. É que não há uma única razão para haver segredo nestas matérias, a não ser evitar que a opinião pública perceba que está a ser manipulada.]"

4 comentários:

Anónimo disse...

Ora cá temos mais um “flexi”, desta feita o “flexicódigodoscontratospúblicos” mais um salve-se quem puder do neo-liberalismo, com o alto patrocínio dalgum daqueles escritórios de advogados também representados em tudo quanto é comissões de honra e em mandato de qualquer coisa de qualquer candidato a eleições a qualquer posto.
Ainda a propósito da polémica da Ota - Alcochete, lembrei-me de Rio Frio e passei pelo “Depoimento” do Pai do Direito Administrativo Português, o Prof. Marcello Caetano, e a pag. 106 e 107 (Cap. III – onde subtilmente MC com a sua subtil escrita, sem indicar nomes, nos informa quais os interesses económicos que se livraram do açaime e lhe morderam, finalmente, em 25.04.74 ) vem referida a necessidade e a tomada de decisão (DL de 08.03.1969) de construir o novo aeroporto de Lisboa e os estudos efectuados (já antes de 1968) que pendiam para a sua construção na Herdade de Rio Frio “a segunda propriedade rústica do País em área” para o que “foram feitas as diligências necessárias à expropriação da herdade”.
Ora, passados 40 anos ainda andamos a pensar na localização de algo que já fora decidido, porque?
A “chave” da questão, não será quem é proprietário dos terrenos da Ota, nem o Estado ser proprietário dos terrenos de Alcochete, a “chave” será quem era (ou é)o proprietário de Rio Frio?
Durante muitos anos, até ao novo Código, as expropriações eram um desastre económico para os expropriados e ainda hoje, vende-se melhor no mercado do que se recebe quando se é expropriado.
Sobre o medo de represálias dos nossos empresários e seu comportamento histórico, recomendo a leitura do acima referido Cap. III do citado “Depoimento”, o retrato, não podia ser mais actual, com a diferença que agora alguns têm muito mais medo de represálias do que outros.
R.A.I.

Anónimo disse...

Todo este estudo cheira mal.

Conclui-se que Sócrates manda no estudo mas não paga (para já).Alguém acredita que aqueles ilustres paguem um estudo cujo destino é o balde do lixo? Pagam hoje, recebem amanhã...
Não se estudaram mais alternativas por falta de capital, no entanto, eliminam-se outros financiadores a pedido do PM.

O estudo não é entregue ao Sócrates (que o encomendou) mas ao PR.

Cavaco está a ser tomado por parvo! Será parvo se continuar calado.

aviador disse...

Para correcão :

O estudo foi entregue na semana anterior ao governo.

Ao Cavaco na 2ªfeira seguinte com grande publicidade.

A fantochada é a mesma!

MasterMoon disse...

Os Srs, representantes de algumas das confederações mais poderosas de Portuagal, sem nenhum sentido de moralidade, pedem:
Deixem despedir este gajo, se não concordar com as suas ideias politicas ou com a sua ideologia!!

Já agora, digo eu, porque não pedir tambem justa causa para a cor da pele, ou o tipo de penteado, ou ainda a cor dos sapatos.

A mim parece-me que deviam ir mais longe, e pedir apenas:
Deixem-me despedir à vontade !!

Pelo menos sabiamos as linhas com que nos cosiamos, e não seria esta bandalheira, em que anda meio mundo a enganar outro meio, tudo a bem das aparências.

O meu país está podre, e cada vez mais me parece que só uma revoluçao a sério podia resolver isto.

Vamos fazer um golpe de estado inovador, e implementar uma ditadura democrática.

Portugal é o país onde é mais dificil aos jovens iniciar uma vida independente, e que tem neste momento o maior indice de quadros superiores a sairem para o estranjeiro.
E vêm estes Srs, dignissimos depositários da esperança económica do meu país, pedir condições ainda piores para os trabalhadores.


Quando o meu povo não suportar mais ver os filhos partirem, quando as mães deixarem de chorar e agarrarem em armas, então, seguramente haverá uma bala com o nome deles.
Talvês passados 50 anos venham a ser martires caídos durante uma revolução, mas com o seu corpo ainda quente e o sange a jorrar da testa, o povo beberá vinho e sorrirá de felicidade.

A luta continua, contra os filhos da puta