3.10.05

MATCH NULO

Li nos jornais de fim-de-semana que Soares, primeiro, e Alegre, depois, se disponibilizaram para votar um no outro numa eventual segunda volta presidencial em que um deles esteja presente. Também li que ambos consideram "hipotética" a passagem do outro à dita segunda volta. Soares, aliás, com a proverbial delicadeza que o caracteriza e, desta vez, acrescida de uma aguda percepção aritmética, jurou que Alegre "não toca" no eleitorado PS. Só ele, pelos vistos, é o dono do referido eleitorado, apesar das amabilidades mútuas. Por seu lado Alfredo Barroso, que aparece como o pré-porta-voz da recandidatura do tio e "coordenador" da campanha, assegura que "Alegre fará todo o mal que puder" ao referido tio, supondo-se que a perfídia inclua sonegar votos ao tal eleitorado "exclusivo". Eu leio isto tudo e fico com pena. Há vinte anos, Mário Soares era o candidato que partia da "esquerda democrática" para "arrumar", pela força do voto, os equívocos e os resquícios mal resolvidos da "revolução" e, simultaneamente, impedir a eleição de um equívoco de outra natureza para Belém. Dizia-se, então, no MASP I, que a sua era uma "candidatura necessária". E o eleitorado - não diminuído, como agora está, pelo estigma partidário -, deu razão à necessidade dessa candidatura. Os jogos florais entre Soares e Manuel Alegre, apesar da tentativa pífia do remake de 1986 com Zenha, revelam dramaticamente a desnecessidade de uma destas candidaturas. Infelizmente a que parecia mais "natural" - a de Alegre -, depois dos ziguezagues do seu principal protagonista, tornou-se vagamente exdrúxula. Soares impôs-se - ao secretário-geral do PS, ao partido e ao país exactamente por esta ordem -, retirando, no seu "código genético", toda a "necessidade" do exercício, algo que ele tem andado a apregoar pelo mundo, mas que ninguém, com dois dedos de testa, consegue enxergar. Contudo, ambos falam do mesmo, para o mesmo e, sobretudo, contra o mesmo. Na sua pueril rivalidade de opereta, ainda não repararam que se anulam mutuamente. Assim sendo, tal significa que o país pode perfeitamente, e agradecido, passar sem eles.