Hoje é dia das diversas "viúvas Porcinas" de Sá Carneiro se manifestarem. Muitas delas eram execradas pelo dito cujo ou pura e simplesmente ignoradas. Outras nem sequer existiam politicamente. Certo é que pouca gente pode, com honestidade intelectual, falar com algum rigor de Sá Carneiro, trespassado pela lança da morte, como um herói wagneriano, em pleno campo de batalha. Inglória? Sem dúvida. O país não entendia como se podia governar bem com Eanes e, no dia a seguir à segunda vitória da AD em Outubro de 1980, já não se podia. Ao longo desse ano de eleições, as indicações eram invariáveis - o "povo" queria Sá Carneiro como 1º ministro e Eanes como PR. Nos depoimentos dados ao Público (a Miguel Gaspar), Vasco Pulido Valente e José Medeiros Ferreira resumem a coisa. «Francisco Sá Carneiro deu um grande passo para a democratização do regime. Fez uma coisa que foi decisiva depois do 25 de Abril. Levou a direita legalmente para o poder. Deu o direito à direita para governar. A direita foi eleita democraticamente e governou o país serenamente e democraticamente, sem qualquer tipo de perseguições (...). Sá Carneiro tinha a capacidade de ver realisticamente o estado em que está a sociedade que ele se propõe governar, de apreciar realisticamente os meios possíveis para agir sobre ela (...). Tinha uma grande confiança nele. Era muito educado; tinha lido muito, sobre arte, sobre história, sobre arqueologia, sabia imenso sobre arqueologia e da sua profissão, era um bom advogado. Era uma pessoa segura de si própria. Tinha um grande talento político. E não era uma pessoa fechada, pelo contrário (...) Eu não achei até certa altura impossível que Eanes e Sá Carneiro se entendessem para tirar os militares do poder. Quando ganhámos em 1979, opus-me ao confronto imediato com ele (...) Eanes é um conservador, mas é um militar. Não se deixam soldados mortos no campo de batalha. No fundo, queria proteger os amigos e que não houvesse represálias. Queria tirar o exército da política, mas não sabia como o fazer (...). Quando chega ao fim do jogo, não pode dizer ganhámos, mas agora não podemos continuar a jogar com este presidente do clube (...) Ele saía e ficava com o prestígio e o poder; e mais adiante voltaria.» Medeiros Ferreira recorda que «Sá Carneiro não queria ficar prisioneiro da direita» (e daí o acordo com os Reformadores negociado directamente entre Sá Carneiro e Medeiros Ferreira) e, «sendo emotivo, tinha métier político, uma coisa mais rara do que se pensa» porque «o que ficava estabelecido era executado, era uma personalidade fiável, voluntarioso e determinado.» E diz mais. «Havia um lado importante - as coisas eram mais transparentes, ele não dissimulava. A arte da dissimulação é uma arte católica portuguesa. Os grandes talentos políticos portugueses são dissimulados e Sá Carneiro não era dissimulado», concluindo que «os tempos difíceis fazem os grandes líderes.» Agora temos tempos difíceis e nenhum grande líder. Se calhar não merecemos melhor.
Foto: Ephemera
Foto: Ephemera
12 comentários:
Titula um jornal de hoje: "Três marias com alegre".
Sempre gostaria de ver o que é que uma múmia pode fazer com mais três...
ficam por contar todas as cornadas que lhe deram os touros do regime.
foram diversas as touradas.
não foi o único a ser colhido em praça.
estamoa a sofrer as consaquências da sua morte.
ficaram os ratos vorazes
Enquanto não se fizer um esforço para se revolucionarem dinâmicas estruturais obstaculizantes de um autêntico desenvolvimento sócio-cultural, mudarão, apenas e tão somente, as personagens dissimuladas em palco (os espectadores, i.e, todos nós , limitar-se-ão a aplaudir as suas consecutivas entradas e saídas de cena, apupando-os e aplaudindo-os, à vez, face às sucessivas hecatombes...a esperança sebastianista desprovida de memória a longo prazo cauciona este status quo algo demencial ...a matriz da beatice queirosiana é tão forte que a considero até mais proeminente nalguns cantões portugueses de esquerda do que de direita, o que é de ir às lágrimas, se bem que a direita tb tenha muitas espécies de men e women :) deste teor- lá está é uma forma mentis que faz com que (quase) todos se afigurem como seus enunciadores...claro que há pessoas intelectual e vivencialmente rectas, detentoras de uma mentalidade cosmopolita e autenticamente desempoeirada...mas, infelizmente a matriz ainda é muito forte...
Quem estará por trás de Sá carneiro na foto?
Apesar de ultimamente não comentar não posso deixar de enaltecer este que aqui escreveu...
Saudações Chaladas
Esta posta é super enfadonha.
Qual a virtude de levar a direita para o poder?
Em trinta anos quem, senão a direita, arruinou Portugal? Quem está gordo e anafado, quem beneficiou com o crime? Quem tornou as leis e os códigos ilegíveis e ineficazes, sabotou os serviços públicos, fez reformas sobre reformas, sempre para pior? Quem formou Governos corruptos, às ordens da oligarquia banqueira, especuladora e rapace, fora da lei e isenta de impostos? Quem, defendendo a concorrência e o liberalismo, entregou a economia a monopólios, na posse da mesma banca? Quem nos endivida, para lucro da mesma banca?
Que benefícios temos da direita no poder?
Isabel Metelo,
Finalmente aparece alguém neste blog que escreve umas "coisas" acertadas!
Então e o comentário das "famelgas"? Não é oportuno?
PC
O que esses cavalheiros dizem sobre o que é ou não é católico não interessa nada. VPV e MF nada sabem do que é o 'catolicismo'. Sá Carneiro pelo contrário era católico e sabia o que isso significava. Não é um palerma qualquer que não faz a mínima ideia do que eram e sáo as 'equipas de Nª Sª (ou a Juc, ou o graal, ou o Mce) que pode saber quem era e o que queria Sá Carneiro (ou Guterres ou Pintasilgo, ou o inefável Pureza). O pobre do VPV confessava hoje que sempre andou entre economistas e sociólogos... coitado! Isso paga-se.
A direita fez erros governativos vários, mas quem arruinou este país foi a esquerda e o PS. Tudo começou com Guterres e o seu actual sucessor em São Bento.
Hoje todos os «orfãos» de Sá-Carneiro desceram à praça.
Inclusivé aqueles que o trairam e o combateram, mesmo dentro do próprio partido.
Em Portugal, é assim, depois de morto qualquer pessoa é colocada num altar...
Sá-Carneiro, um político combativo e um osso duro de roer, não foi, nem um anjo nem um demónio.
Penso que ele detestaria muita da folclórica hagiografia que existe em redor da sua pessoa.
Enviar um comentário