A Portugal
Esta é a ditosa pátria minha amada. Não.
Nem minha amada, porque é só madrasta.
Nem pátria minha, porque eu não mereço
a pouca sorte de nascido nela.
Nada me prende ou liga a uma baixeza tanta
quanto esse arroto de passadas glórias.
Amigos meus mais caros tenho nela,
saudosamente nela, mas amigos são
por serem meus amigos, e mais nada.
Torpe dejecto de romano império;
babugem de invasões; salsugem porca
de esgoto atlântico; irrisória face
de lama, de cobiça, e de vileza,
de mesquinhez, de fatua ignorância;
terra de escravos, cu pró ar ouvindo
ranger no nevoeiro a nau do Encoberto;
terra de funcionários e de prostitutas,
devotos todos do milagre, castos
nas horas vagas de doença oculta;
terra de heróis a peso de ouro e sangue,
e santos com balcão de secos e molhados
no fundo da virtude; terra triste
à luz do sol calada, arrebicada, pulha,
cheia de afáveis para os estrangeiros
que deixam moedas e transportam pulgas,
oh pulgas lusitanas, pela Europa;
terra de monumentos em que o povo
assina a merda o seu anonimato;
terra-museu em que se vive ainda,
com porcos pela rua, em casas celtiberas;
terra de poetas tão sentimentais
que o cheiro de um sovaco os põe em transe;
terra de pedras esburgadas, secas
como esses sentimentos de oito séculos
de roubos e patrões, barões ou condes;
ó terra de ninguém, ninguém, ninguém:
eu te pertenço.
És cabra, és badalhoca,
és mais que cachorra pelo cio,
és peste e fome e guerra e dor de coração.
Eu te pertenço mas seres minha, não.
Jorge de Sena
5 comentários:
A «violência contida», hoje, em Portugal, é uma bomba relógio. Haverá cientes ?
Oh homem
Do OUTRO,publicaram uma série de textos com claro título: A PÁTRIA NÃO SE DISCUTE.
O Senhor D. Carlos I também dizia: "são osportugueses que eu tenho"
E digo eu (devo estar aplagiar alguém): cada povo tem o governo que merece.
Estamos reduzidos a "isto".
Perdão,o que o D. Carlos disse (para o Saldanha em Inglaterra a caminho de Portugal) foi: -Anda Saldanha, lá voltamos à piolheira...
Que ricos exemplos.
Um despeitado e um gorducho que nunca soube o que era trabalhar e sempre viveu à tripa forra à custa do trabalho alheio.
Com gente desta, que nega/desdenha a terra em que nasceu e por ela nada fez, há muito estaríamos extintos.
Ao contrário, com dificuldades muitas e de toda a ordem cá estamos. Aos desesperados e iluminados aconselho empenho na mudança ou a emigração para não chatearem os que não desistem de acreditar que amanhã pode ser melhor do que hoje.
Portugal é dos resistentes e não dos desistentes!
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