30.3.05

O REINO FLUTUANTE

Apeteceu-me este título velhinho do Eduardo Prado Coelho, lembrando-me que era aí, num hipotético e virtual "reino flutuante", que eu queria estar. Preferencialmente rodeado das personagens-fracasso de Lawrence Durrell construídas no seu Quarteto de Alexandria. Não me comovem excessivamente os bem sucedidos e os contentinhos da vida. Desprezo a superficialidade banana do "homem médio" e a alegria pateta dos que esperam ardentemente pela sexta-feira para um jantar frívolo entre "casais". Do que eu realmente gosto é da nobreza do fracasso e da erosão do falhanço. No último livro do Quarteto, Clea, a dada altura Justine, que tinha desaparecido logo no primeiro livro, diz qualquer coisa como isto: "vontade de engolir o mundo". É isso que eu sinto. A maior literatura não é feliz e, como diria Pessoa, tem a tremenda consciência disso. Não perceber isto - é a vida que verdadeiramente imita a arte e não o contrário - é andar por cá a ver passar os comboios. Talvez por isso Camus tivesse escrito que o suicídio era a única questão filosófica. Terminado o circo da nossa vida pública, tendemos a voltar-nos para o espelho. Eu não gosto minimamente do que vejo. Tenta e fracassa. Tenta outra vez e fracassa melhor, mandava o Beckett. Eu concordo com ele. Tento e fracasso. Tento outra vez e fracasso sempre melhor.

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