EM VÃO
Enquanto o País se dividia entre "vermelhos" e "azuis", e as televisões procuravam encontrar o comentário mais bárbaro produzido por fanáticos grotescos semi-alcoolizados, o Dr. Barroso, solene e composto, desfilava numa procissão nos Açores. Perturbava-o -disse - a circunstância de nenhum primeiro-ministro jamais ter tido a brilhante ideia de participar naquela procissão, à excepção dele próprio, naturalmente. Entende-se o fervor. Na véspera, uma sondagem anunciava uma pesada derrota nas eleições regionais para o arranjo local entre o PSD e o PP. Por cá, no "continente", o mesmo arranjo também não promete grandes sucessos para Junho. Por isso, chega a ser escandalosa a forma como os próceres da insigne aliança entre sociais-democratas e pequenos populares, anelam por uma vasta abstenção nas "europeias". São estes mesmos "bons cristãos" que, no momento em que se prepara a assinatura de uma nova Concordata com a Santa Sé, estimulam sinais internos no sentido de confirmar que a "cortina" corrida entre o Estado e a Igreja, na expressão de Salazar, não está verdadeiramente bem corrida. Com todos os seus inúmeros defeitos, Salazar tinha, apesar de tudo, o chamado "sentido de Estado". Era o "dele", cínico e reaccionário, mas era "um". Esta gente não tem nenhum. Independentemente das minhas convicções pessoais nesta matéria, eu sou ferozmente adepto de um Estado laico e de uma Europa laica. Não há nada de mal em acompanhar o "povo" em festa atrás do andor, por entre flores e cânticos esperançosos. Coisa diferente é cultivar uma ambiguidade oportunista, pouco "cristã" e dita "democrática" apenas destinada a invocar o nome de Deus deliberadamente em vão.
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