6.11.06

OS NEO-REFORMADORES

A entrevista de José Medeiros Ferreira ao Diário de Notícias. Agora que tanta gente descobriu a palavra "reforma" como se ela nunca tivesse existido, as palavras de JMF, para além de politicamente interessantes - porque vindas de um militante de um partido que está a perder todo o interesse - vêm repôr, junto de uma opinião pública cada vez mais amorfa, o valor insubstituível da crítica e do debate. Na semana em que o partido do governo se reúne num congresso que será uma espécie de conselho de ministros alargado aos "rapazes e às raparigas", Medeiros Ferreira relembra que é da tradição do socialismo democrático e da social-democracia a discussão, a livre discussão. O impulso dito reformador do primeiro-ministro só convence os palonços e os oportunistas sem memória. Parece que, com Sócrates, se inventou a escrita. Não se inventou nada. Sócrates estava tão preparado para governar como Barroso antes dele ou mesmo eu. Os primeiros governos de Mário Soares, de 76 a 78, a Aliança Democrática, de 79 e 80, e algum "cavaquismo" fizeram as reformas fundamentais. As do sistema político, valorizando a política "civil" democrática, que culminou na revisão constitucional que extinguiu a legitimidade "revolucionária" da tropa, as que introduziram alguma flexibilidade económica no registo "estatista" amanhado à pressa no PREC e o pedido e a consequente adesão à Europa, sem as quais o doentio atavismo nacional nos remeteria para um periferia infinitamente mais lúgubre do que a actual. Sócrates, pelo contrário, descobriu em cada português uma corporação e um inimigo a abater e, com isso, justifica a sua pulsão "reformista". É evidente que tudo se reduz à mercearia, ao défice, às continhas e a um autoritarismo espúrio que acabará por se virar contra os seus mentores. "Essas derrotas [autárquicas e presidenciais], as manifestações e as greves devem ser fontes de ponderação para as decisões governamentais. Mal iria qualquer Governo que, tendo perdido duas eleições, não ponderasse o seu modo de decisão, por muito que isso custe às pessoas que gostam de decidir rapidamente" - aconselha JMF ao "governo TGV". Ele, na sua vertigem autista e muito contentinha de "ipod" na orelha, não deve escutar. E é pena. Pode ser que se arrependa.

3 comentários:

Anónimo disse...

Seria de facto interessante traçar um retrato dor períodos de reformas em Portugal, e as circunstâncias e pessoas que lhes deram origem.

Anónimo disse...

Vou reter o neo-reformador...

Anónimo disse...

O ditado é antigo mas encerra uma verdade irrefutável "res non verba" para os romanos, para nós pode ser "as palavras convencem mas os exemplos arrastam", apesar da globalização, ainda continua válido. Vem isto a propósito do nosso "stalonne" das reformas, o voluntarioso (também mentiroso) engenheiro Sócrates. Toda a gente sabia, pelo menos os que pensam pela sua cabeça, que a situação do país era grave e urgiam mudanças, algumas mesmo muito radicais. Daí até ao que se está a passar vai uma grande diferença.
Este senhor quer fazer passar uma imagem de integridade e de "cortar a direito" e tem conseguido boa parte desse objectivo graças a uma oposição que reparte com o PS as culpas totais do status quo e, portanto, cala-se até porque brevemente vai haver novas eleições e, se este governo conseguir tudo o que quer, o PSD, caso ganhe as próximas legislativas, tem tudo feito para que os seus "boys" continuem o regabofe habitual. Outros culpados são o Presidente da República que, quando foi primeiro-ministro, caso não fosse tempo de vacas "gordas", teria feito exactamente o mesmo que Sócrates está a fazer; a comunicação social que revela estar totalmente subjugada (os mecanismos são vários e há muitos jornalistas inocentes e a sofrer de várias formas); os militares cujos generais olham lá do alto como se esta realidade se passasse noutro país; os deputados, poder regulador, moderador e justiça. É natural que muita gente tenha as mãos atadas e não mereça ser nomeada. No meio de todos eles, os mais asquerosos, cobardolas, lambe-botas e pseudo-intelectuais, economistas ou que lhes queiram chamar, são os comentadores políticos.
No meio de tanta ilustração e ciência, ainda nunca ouvi nenhum deles falar com racionalidade e dizer mais ou menos assim:
A situação é grave, temos de combatê-la mas, para a combatermos temos que saber a sua origem. Por que motivo o país está assim? Porque não há crescimento económico? Como e onde se gastou tanto dinheiro?
Poderíamos reportar a origem disto a D. Afonso Henriques e dizer que o que começa com um rapaz a bater na mãe não pode acabar bem mas não é preciso. Basta recuarmos ao pós 25 de Abril e recordarmos que o assalto ao erário público foi de tal ordem que, em 1977, já Mário Soares andava, como uma velha, de cesta na mão, a mendigar empréstimos ao FMI. Como foi possível em tão pouco tempo roubar tanto? Lembremos que em 74 o PIB crescia 7.4% ao ano apesar de sermos, praticamente, uma economia de subsistência, com processos muito rudimentares. Apesar de tudo, havia agricultura, pesca, indústria, turismo e, muito importante, havia educação e respeito por valores como a família, a escola, a religião e os idosos. Naquela altura o meu pai, analfabeto, agricultor de minifúndio, formou dois filhos. Agora, nem um posso formar e tenho formação superior.
Mas passemos à frente. Entretanto Sá Carneiro morre (acidente?), pouco depois vem Cavaco que deu rédea larga aos "boys" e açambarcaram os fundos perdidos da CEE para os empregarem em tudo menos em investimento económico. Tudo passou incólume mas, qual foi o resultado desta impunidade? Perdemos a agricultura, a pesca e uma boa parte da indústria. A CEE assistiu a isto impassível pois eles até já sabiam o que ia acontecer. Era o que eles queriam!
O nosso PIB afundou-se definitivamente e, mais que nunca, ganhou-se o hábito do "vale tudo", da cunha, do padrinho, etc. Nesta altura o dinheiro começou a falar mais alto que a educação.
Depois de Cavaco vieram os Governos Socialistas que também tinham "boys", o CDS|PP também! É preciso compor mais o ramo?
No meio destes processos há as eleições, as campanhas eleitorais e não podemos esquecer o que aconteceu com a JAE e porquê. Eleições vencidas, mudanças de governo, indemnizações pagas a detentores de cargos públicos de confiança política, colocação de maus ministros em bons lugares de organismos estatais. As empresas públicas e seus prejuízos, como porquê, quem? As derrapagens orçamentais de obras públicas. O custo da Presidência da República que é superior ao da Monarquia em Espanha. O custo da Assembleia da República onde duzentas e tal almas vêm cantar de galo após noitadas ou viagens que nunca fizeram mas que foram debitadas. As autarquias locais que, como extensões dos partidos, também tinham favores eleitorais a pagar desataram a admitir funcionários, a fazer obras de fachada, ou não, por vezes, mas que cada vez dão mais a ideia de castelos feudais onde temos de ir pedir ao suserano que, por favor, nos deixe usufruir dos nossos direitos...
Bem, a lista já está longa para este espaço. No fundo, o que quero dizer é que Sócrates, se na realidade fosse alguém tão íntegro, tão corajoso e recto como pretende mostrar, sabe bem a quem pedir contas e fazer pagar a factura da crise ou seja; o seu próprio partido, o PSD e o CDS, os Presidentes da República, deputados, empresas públicas e seus gestores, autarquias locais, bancos, seguradoras e muitos empresários com Belmiro à cabeça.
Para ter alguma autoridade moral, Sócrates deveria ter começado a tomar medidas de austeridade fortes e claramente visíveis na reforma do Parlamento, dos serviços governamentais, das empresas de capitais públicos, nos partidos políticos, nas autarquias; deveria acabar com a lei das prescrições e investigar os crimes ocultos e fazer todos os culpados de crimes financeiros pagar a sua parte. Só depois teria legitimidade moral para vir pedir sacrifícios aos mesmos de sempre.
Mas, na verdade Sócrates nunca teve essa intenção: veja-se a forma como em campanha eleitoral não fez tantas promessas como era habitual e veja-se, sobretudo, a tramóia que começou na queda de Santana Lopes e acabou na eleição de Cavaco, com os episódios Alegre e Soares pelo meio. Ali andou muito dedinho maçónico e capitalista!
Sócrates é apenas mais um... e a prová-lo vem a notícia do Tribunal de Contas da desorçamentação de mais de 300 milhões de euros. Todos tentam meter o lixo debaixo do tapete. Se o Presidente da República não fosse da mesma laia, tinha um motivo tão válido como o de Sampaio para dissolver a AR.