Por causa do passamento de Mário Cesariny (vai ser interessante acompanhar o "movimento das piranhas" que se vão "atirar" ao espólio do pintor), falei no José Manuel dos Santos, seu amigo de muitos anos feito. Por isso, aguardo com natural expectativa a sua "Impressão Digital" da próxima semana no Expresso. Já a de sábado, 25 de Novembro, me merece alguns comentários. Sob o título "O Referendo", o José Manuel, com a habilidade e a elegância de sempre, reduz a questão do aborto - ele, com a mesma eloquência que atribui ao cardeal patriarca de Lisboa, refere-se sempre delicadamente a "IVG" - como uma questão religiosa onde o direito e a supremacia do Estado laico e democrático deve ser inquestionável perante uma Igreja "intransigente" acerca do livre arbítrio humano. E coloca os adeptos do "não" num mesmo registo, "uma voz onde não há lugar para uma distância ao ódio". Apesar de não ser católico, o Zé Manel deve saber tão bem como eu que há tantos caminhos para Deus quanto há homens. Dito isto, nem todos aqueles que votarão "não" no referendo anunciado o farão por causa do que defende a Igreja, mas apesar disso. Aliás, não se esperaria que a Igreja pugnasse por outra coisa, mesmo quando o cardeal patriarca fala em "questão de consciência". A Igreja cumpre o seu papel com os mesmíssimos direitos que assistem aos indivíduos e associações que perpetram pelo "sim". Tem muita influência, é demasiado "institucional"? É natural que tenha e que seja, por razões já de há muito debatidas. Não pode é ter qualquer capitis diminutio em relação a outros movimentos de natureza "laica". Digo isto com o à vontade de quem é favorável à aplicação da lei em vigor, ao criar de condições para esse efeito e que é contra a banalização do aborto, em pleno século XXI, como remédio para um descuido, para um atrevimento ou para a mera ignorância. Não há nenhum arquétipo feminino, por muito respeito ele me mereça, que se sobreponha a um outro arquétipo que escolha o "direito à vida", e vice-versa. Por isso apoio as excepções legais. E, só para terminar, não creio que a Igreja exerça qualquer soberania "sobre os corpos e as almas" e que tema perdê-la. Para além das contingências e do relativismo, a Igreja sobreviverá - sobretudo esta, de Ratzinger - e, com ela, milhões de católicos "pecadores" que encontram ali o conforto espiritual e ético que, infelizmente, até o "Estado social de direito" não consegue dar. Há, pois, vida para além de um simples "sim" ou de um simples "não".
6 comentários:
João:
"Poeta e pintor doou bens à Fundação Cupertino de Miranda
Espólio de Cesariny integrará Centro de Estudos do Surrealismo em Famalicão "
26.11.2006 - 17h45 Lusa
http://www.publico.clix.pt/shownews.asp?id=1277877
Há para aí muita coisa espalhada para além do "oficial"...
Um post muito bem pensado e lúcido. Bem haja!
Comentário assertivo e enxuto!
excelente escrito.
porque será que é tão difícil ser inteligente ?
Com todo o respeito pelas suas convicções, quero relembrar-lhe que "direito à vida" é uma frase feita,um cliché, que nada esclarece, se não forem aduzidas circunstâncias de todo o tipo e inclusivé conceitos, semântica e acepções do lexema "vida", como muito bem conhece.
Cumprimentos
Vi.
Enviar um comentário