O mesmo tipo de imprudência com as leituras revela-se em José Sócrates sempre que quer mostrar que lê, o que faz mais amiúde do que devia. Na campanha eleitoral meteu os pés pelas mãos a falar de Pessoa num registo pseudo-intimista e agora, há dias, numa entrevista da Visão, diz, numa frase displicente, que já não lhe interessa ler Marx, agora vai ler é Keynes. Já esta maneira de falar denota o escasso convívio com os autores que cita como se fossem seus familiares, porque conhecer Marx é tão importante, senão mais, do que conhecer Keynes. E se a frase pretende mostrar que um está “desactualizado” e o outro não, então estamos perante uma boca que se admite num blogue adolescente, mas que não tem sentido num grande deste mundo que está a falar do que lhe interessa.
Quem diz uma coisa destas - ele não está a dizer que Keynes é mais importante no seu entender para perceber a realidade actual, mas sim que “vai ler Keynes” em contraponto com um Marx que já teria lido - não faz a mínima ideia do que está a falar. Keynes escreveu muito e sobre muitas coisas, do alcoolismo a vários artigos sobre economistas, e um ou outro pequeno livro mais popular. Será que o Keynes de que ele está a falar é o de alguns desses pequenos livros, que conheceram alguma notoriedade nos anos trinta? Duvido, porque o Keynes de que se anda para aí a falar a pretexto da crise económica - e é desse que Sócrates está a falar - é o da Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda.
Ora, eu não li a Teoria Geral, mas tenho uma ideia do conteúdo do livro, da sua complexidade e do seu tamanho. Tenho aliás um exemplar completo (muitas vezes há apenas antologias) que consultei para escrever este texto e não tenho dúvida nenhuma de que falar assim do livro, ou da obra de Keynes, é um pouco semelhante à do operário que num “romance social” aparecia cheio de ardor revolucionário na fábrica depois de ter lido o Capital durante a noite, ou da minha aluna leitora de Kant.
A Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda é um texto complexo, com mais de 400 páginas cerradas, muitas vezes com fórmulas matemáticas (anexo um exemplo ao acaso do texto original), um livro que para um economista é matéria de estudo e mesmo assim sem precisar de o ler todo, para um estudioso de Keynes obrigatório, mas sempre longe de ser a leitura displicente que José Sócrates sugere.
Ninguém é obrigado a ler, nem sequer se deve julgar Sócrates como primeiro-ministro por ter lido Marx ou Keynes, mas não fica bem parecer que se lê o que não se lê, ou que se vai ler, o que não se vai ler. Aliás, como acontece sempre nestas escorregadelas, ninguém lhe pediu para mostrar saber e leituras.
José Pacheco Pereira, na Sábado Online
6 comentários:
é fácil verificar o tipo de cultura do pm.
se tivesse um pouco de bom senso ficava calado a este respeito
O Zézito,conhecido bacharel sanitário da nossa praça, leitor ?!
De "cassettes", provàvelmente...
O dito cujo é praticamente analfabeto. Como é trafulha desde bebé, foi passando fraudulentamente todos os graus de ensino. O caso "independente" foi apenas mais um na vida "aventureira" do bichano.
Mas o tipo quer ser visto como um poço de cultura e sabedoria, porque acha que isso dá status e combina com os Boss e Armani que tem no armário.
Vai daí, sempre que pode mete uma bucha culturaleira nas conversas que tem com os entrevistadeiros de serviço. Como estes também não sabem grande coisa nem sequer o questionam pelos disparates.
PC
O que o JPP não sabe é que a leitura de Keynes fazia parte do programa da cadeira de Inglês Técnico da Universidade Independente.
Que eu saiba (e sei do que falo), a única "obra" que o suposto eng. leu foi o "Tio Patinhas". Nada mau. Mas até isso já esqueceu, coitado.
Eu não concordo nada com o tom do artigo. E falo por experiência própria, pois já li, aqui há uns anos, um livro quase inteirinho.
Mas disseram-me que faz muito mal aos olhos, principalmente para quem andava a ler tanto como eu.
Prefiro ver bem, e ter uns olhinhos bonitos, que essas coisas da cultura, que não fazem falta nenhuma.
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