O Mário, o melhor dos amigos, gostou da adaptação televisiva do livro "The Line of Beauty", de Alan Hollinghurst, traduzido pela Dom Quixote. E compara-a com "Brideshead Revisited", a série "fetiche" do princípio dos anos oitenta, baseada na obra homónima de Evelyn Waugh. Revi "o passado em Brideshead", em dvd, há pouco tempo. Com o devido respeito e amizade, o Mário não tem razão. Não consegui passar sensivelmente do meio do livro de Hollinghurst e já li várias vezes, noutra encarnação, o de Waugh. Também não me parece que sejam comparáveis as séries. "Nick", o personagem central de "The Line of Beauty", não tem a mínima consistência. O vago "picante" de pôr a "Dama de Ferro" a dançar com ele numa festa pretensiosa e cheia de "cheiros", não faz um momento literário-televisivo. Depois, a imaturidade sexual do rapaz Nick é praticamente insuportável e as cenas de sexo dignas de documentários eróticos da Playboy, mas com homens. A reconstituição dos "anos de chumbo" da SIDA e a fixação no aparente paradoxo comportamental dos "conservadores", também não entusiasmam. Pelo contrário, por "Brideshead Revisited" perpassa a verdadeira "linha da beleza". Não apenas a física dos protagonistas, mas a da amizade viril que unia Sebastian e Ryder - que depois juntou, por efeito substitutivo, Ryder à irmã de Sebastian, Julia - e - fundamental na obra de Evelyn Waugh - a da questão católica, serena e estupendamente marcada nas interpretações de Claire Bloom e de Sir Lawrence Olivier, os pais separados de Sebastian e Julia. Et in arcadia ego, o primeiro capítulo do livro de Waugh e da série, reconstitui a ambiguidade sexual do campus universitário de Oxford, nos anos vinte e trinta do século passado, e a emergência da II Guerra Mundial. São, a série e o livro, obras de desencantamento. No meio das manobras do exército inglês, perto de Brideshead, de novo, Charles Ryder constata que, aos trinta e nove anos, "começou a envelhecer". O resto da história é o que ficou irremediavelmente para trás antes desse envelhecimento prematuro. Ryder percebeu que tinha estado no paraíso e que o tinha perdido. Como a ave de Minerva, só levantamos voo ao crepúsculo.
5 comentários:
João, sabia que vem aí a versão cinematográfica de Brideshead Revisited, cujo argumento estará a cargo do mesmo Andrew Davies de A Linha da Beleza?
Só espero que, recorrendo à caracterização, deixem a eterna parelha Irons & Andrews.
Um abraço
Atenção à ortografia: "festa pretensiosa"!
Comparar um livro com outro (ou uma série de televisão com outra) nestes termos é sempre injusto para uma das obras. A Linha da Beleza, na minha opinião, é um bom livro, embora seja excessivo pedir-lhe para ser Brideshead, pois não tem o tempo necessário para o ser. Os bons livros parecem violinos, precisam de décadas ou de séculos para abrirem o som.
Brideshead é o filme (acho tão injusto chamar-lhe série!) mais belo que eu vi na minha vida!
Vi a série primeiro.
Li o livro depois, a tradução portuguesa. Fiquei perplexo. Pensei que fosse da tradução.
Comprei o original em inglês. Não era da tradução.
O filme é perfeito, o livro não.
Não li o Brideshead, mas vi a série e vejo e revejo, e tenho crescido ao lado dela. O que antes me fascinava (e que continua a fascinar...), a pose e os rituais da upper class inglesa católica, agora, pouco a pouco, vai-me dando cada vez mais vontade de rir. O Sebastian e o seu teddy bear e as suas bebedeiras estilosas e tal, os tweeds e coiso, as meninas, e tudo, tudo, em cor pastel, até a tragédia. E o spleen, o spleen. Cá ainda há quem tenha orgasmos com estas coisas.
jeeves
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