«O Orientalismo romântico de Foucault», podia muito bem ser o título deste livro, que coloca, a partir de uma perspectiva feminista e de esquerda, questões profundas e particularmente incómodas sobre o pensamento de Foucault e a sua crítica enviesada da modernidade. Sendo um dos autores canónicos do actual pós-modernismo nas Ciências Sociais e Humanas, o assunto é tanto mais curioso quanto Michel Foucault ganhou fama pela sua «filosofia da suspeição» e pela «desconstrução» das grandes narrativas e utopias ocidentais. Ironicamente, Foucault, o «desconstrutor» e «genealogista», afinal também tinha a sua utopia romântica. Qual era? Vejamos os acontecimentos. Com o início da revolução iraniana, Foucault decidiu visitar o Irão para assistir ao desenrolar desta, que foi objecto do seu particular interesse e entusiasmo como intelectual «engagé». Na sua deslocação ao Irão assumiu um papel de jornalista de investigação, funcionando como correspondente especial do jornal italiano «Corriere della sera». Publicou também algumas das suas peças jornalísticas na imprensa francesa, nomeadamente no jornal «Le Monde» e na revista «Nouvel Observateur». Nesses textos, Foucault retratou de forma quase entusiástica o movimento islamista iraniano liderado pelo Ayatollah Ruhollah Khomeini, vendo-o como uma nova forma de «vontade política», perfeitamente unificada, que abria «uma dimensão espiritual na política». Isto, em contraste com as «cruéis, selvagens, egoístas, desonestas e opressivas sociedades» criadas pelo moderno capitalismo liberal. Como realçam Janet Afary e Kevin B. Anderson, uma ilação profunda resulta do episódio iraniano de Foucault e não está apenas relacionada com este pensador. A ilação é particularmente importante para a actualidade e está relacionada com o fenómeno geral do «fundamentalismo religioso», mostrando a existência de um bloqueio intelectual que afecta várias correntes da esquerda política, impedindo uma resposta adequada a este.»
José Pedro Teixeira Fernandes
José Pedro Teixeira Fernandes
1 comentário:
Já é dia 25.
Peço desculpa de te incomodar João, mas em comentário a post anterior fiz-te uma perguntinha que por sinal agora volto a colocar-te, a propósito da "tentação iraniana" de Foucault lembrada por Teixeira Fernandes.Lá em baixo eu referi-me à concessão de Foucault a uma certa ideia de Ordem e aos riscos dessa revisão de pensamento no domínio do político. E não deixa de ser perturbador que alguém que estudou o delírio, o possa ter "interpretado", no caso em concreto, que é de delírio, como tendo a virtualidade de abrir uma «dimensão espiritual na política». Mas não foi o teu, o nosso homenageado de hoje, que expressamente relativizou a Verdade?
Uma vez mais boa noute e muitos cumprimentos.
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