13.1.04

SANTANA VISTO PELOS SEUS



Na última década, mais concretamente desde que Cavaco partiu, Pedro Santana Lopes procurou a liderança partidária em congressos. Primeiro contra Nogueira e Barroso, depois contra Marcelo e finalmente contra Barroso. As suas entradas em cena eram inesquecíveis momentos televisivos e de forte emoção sentida no coração dos militantes mais sensíveis. Apesar do espectáculo, das louras e do verbo tonitruante, essas mesmas hostes "laranja" nunca lhe deram crédito traduzido em votos partidários. Intuitivo como poucos, deu a volta "por fora" e foi começando a ganhar terreno "no terreno". Conquistou praticamente em absoluta solidão a Câmara da Figueira da Foz. Marcelo ignorou-o. A comunicação social estranhamente poupou-o ( e poupa-o, num jogo de amor-ódio cuja fisiologia ainda um dia se terá de contar...) e, feita a paz com Barroso, chegou a Lisboa. Não faz praticamente nada, mas continua aparentemente a encantar. Outro dia, O Independente decidiu dar voz a alguns dos seus fidelissimos. O que é que eles vêem no homem? "Ele é bom de voto", diz um. Outro não hesita: "as suas qualidades são extraordinárias e fazem dele um dos maiores políticos de Portugal [ atenção agora ] e mesmo do mundo inteiro". Um terceiro acha mesmo que "não há mais nenhuma pessoa que reúna todas as qualidades que ele tem". Um quarto vê ali uma "capacidade de trabalho impressionante". E há mais. Desde quem enxergue na criatura "um pensamento político profundo", até quem ali veja " a afirmação da modernidade" que "aposta na inteligência emocional e no contacto directo com as massas". Estes desvaires babados falam por si e dispensam quaisquer comentários, a não ser um. Com um toque mais ou menos risível, todos eles apontam num sentido a ter em conta: Santana é um voluntarista que capta bem votos. E vai até lá, lá onde esse voto se possa encontrar. Agustina Bessa Luis, que não é exactamente um modelo de sucesso na aventura da política, mas que foi directora do "túmulo do Rossio" na era Santana, apresenta o livro ( o primeiro de três ou quatro, parece!) de Santana Lopes, Causas da Cultura, uma recolha de textos e fotos acerca da passagem de Lopes pela Secretaria de Estado da Cultura, entre 90 e 95. Ou seja, ele vai "a todas". Alguns dos seus "herdeiros espirituais" estão hoje à frente de alguns organismos de cultura, audiovisuais ou mesmo políticos, a milhas de distância da, apesar de tudo, sagacidade do seu mentor. Seguramente isto vai ter a costumada "boa imprensa". Aliás, será deveras interessante recensear as presenças no evento. Porque este frenesim corresponde a uma ambição. Os anteriores candidatos a Belém que tiveram, ora um bom score eleitoral (Freitas do Amaral), ora a vitória (Soares, Sampaio), "cresceram" , em ambição, dos respectivos partidos de origem para a Nação, contornando-os e contando, depois, com eles. Santana já não está refém do seu partido e isso é um aviso muito sério a quem possa pensar que é "candidato natural". Ninguém é "candidato natural" se está à espera de "sinais". Neste sentido, Santana ou Marcelo Rebelo de Sousa são já candidatos muito mais "naturais" do que Cavaco Silva. Mas isso é conversa para um próximo post.

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