Consta que o cidadão José Sócrates apresentou uma queixa contra o cidadão António Balbino. Por razões processuais, isso transforma o dito António em arguido. Não cai o mundo. Aliás, eu, que já li muitos relatórios de auditoria e escrevi alguns, gostava de ter visto ou escrito com o detalhe, a minúcia, ia a dizer, a obsessão com que Balbino perpetra as suas postas. Faz lembrar alguns "anti-fascistas" que passavam a vida a deitar a língua de fora em frente à António Maria Cardoso para ver se iam presos. É evidente - e agora é o jurista que escreve - que Balbino estava à espera de ser testemunha, arguido ou as duas coisas ao mesmo tempo, em um ou vários processos. Ninguém, por mais amor à pátria que tenha, dedica tanto espaço e tanto tempo a apenas um assunto. Já tinha acontecido isso com o processo "casa Pia". Sempre me pareceu - e continua a parecer - que o "assunto licenciatura de Sócrates e adjacências" releva mais de um registo ético-político do que estritamente jurídico ou académico. São os mors da democracia. Todavia, toda a prosa de Balbino tem um único objectivo: convolar o político no jurídico e, depois, retornar, se for o caso, à política. Balbino "investigou" e, nesse sentido, tem agora a oportunidade única de demonstrar no local adequado o resultado dessa investigação. E Sócrates, constituindo-se assistente, de contrariar esse resultado, provando - ele, o Ministério Público e os dois simultaneamente - que nada do que Balbino escreveu faz qualquer sentido. Balbino exerce metabloguismo e não exactamente bloguismo. O seu caso está para lá do alegado mero "delito de opinião", inadmissível no "sistema" em que vivemos. A prova é que, muitos dos que "cavalgaram" os "dados" de Balbino, se calarão provavelmente neste momento. Vamos ver como se portam, sobretudo os jornais ou o Mário Crespo, por exemplo. Aqui critica-se politicamente o primeiro-ministro e o regime, pelo que o episódio em causa só me interessa na medida em que possa afectar o exercício das funções públicas electivas do chefe do governo. Praticamente todos os bloggers que não se identificam com o regime, fazem o mesmo. O resto, para Sócrates e para Balbino, tem a ver com ética, num duplo sentido. O da Teresa Guilherme - "quem tem ética passa fome" - e o de Gilles Deleuze - "a ética é estarmos à altura do que nos acontece". Sócrates, por um lado, e Balbino, por outro, têm agora o plateau para colocarem isto em prática e em pratos limpos. Nem Balbino deve "passar fome", nem Sócrates se deve furtar ao que lhe sucede por estar onde está. Mesmo o pior dos regimes - e este é francamente mau - não pode viver eternamente sob suspeita.