
Tinha 39 anos e chamava-se Vickie Lynn Hogan. De verdade. A natureza, ao contrário da vida, foi-lhe generosa. Graças ao corpo, Vickie passou a ser Anna Nicole Smith. Tinha intimamente a ambição de se tornar, primeiro, Norma Jean, e, depois, Marilyn Monroe. Porventura a cabeça não a ajudou a chegar ao patamar mínimo do esplendor trágico da carreira cinematográfica da original. Só se encontraram na morte, eventualmente tão desejada por Anna como por Marilyn, cada uma à sua maneira, depois te terem sido tudo e o seu nada. Juntaram-se nesse instante imperceptível que todos os artigos, fotografias, filmes, revistas, noites, livros e dinheiro do mundo não chegaram para o evitar. Jogaram o lance solitário definitivo das suas vidas nas quais, aliás, nunca existiu propriamente uma vida. Aos 18 anos, já Vickie/Anna era mãe involuntária de um filho que a precedeu na solidão e na morte. Norma Jean quis ser mãe para poder ser a mãe que não teve, e nunca conseguiu. No momento derradeiro, só tinham por companhia o álcool e esses falsos amigos que são os comprimidos, os únicos que ficam depois de tudo desaparecer. Para muitos, Anna era apenas um belo corpo e umas belas mamas, tal como Marilyn era suposto nunca ter aberto a boca. O lugar comum do "morrem cedo aqueles que os deuses amam" aplica-se a estas mulheres com que a vulgaridade ainda hoje sonha e se masturba. A celebridade traiu-as. No momento em que desapareceram, já só eram dois seres humanos que se aperceberam da sua dramática condição. Como escreveu Norman Mailer a propósito de Marilyn - e, porque não, de Anna - qualquer delas foi atraída por aquela eternidade "she has heard singing in her ears from childhood, she takes the leap to leave the pain of one deadned soul for the hope of life in another, she says goodbye to that world she conquered and could not use. We will never know if that is how she went. She could as easily have blundered past the last border, blubbering in the last corner of her heart, and no voice she knew to reply."