«Perto dos 70 anos, no fim de um Verão em que Portugal deu de si um espectáculo triste, é a altura de perguntar o que a minha geração, que chegou à idade adulta com o "25 de Abril", fez da famosa liberdade tão esperada durante Salazar e Caetano. Para começar, e de acordo com alguns militares sem letras, tentou tudo para a suprimir. Com poucas excepções assistiu calada, ou mesmo se juntou, à louca procissão do PREC, em nome de uma doutrina que não percebia e de uma sociedade em que nunca aceitaria viver. Esta demissão e esta vergonha ficaram para sempre. A ausência do que tinha sido o movimento estudantil entre 1960 e 1974 no Governo e nos partidos entregou o poder a uma série de arrivistas, que não o tornaram a largar. Quem se perdera pelo grotesco labirinto da esquerda bem pensante por uns tempos desapareceu. O "cavaquismo", aliás, dispensava um pessoal democrático e até a política. Um vago resto do PS sobrevivia (bastante mal) à volta de Soares, que se conseguira eleger Presidente da República, e o que sobrava, disperso e desmoralizado, caíra numa absoluta irrelevância. Muita gente (de esquerda e de direita) emigrou, às vezes definitivamente, para a vida privada ou para a máxima sinecura da "Europa". O "novo" Portugal acabou por nascer e crescer à revelia da minha geração: no Estado, nos partidos, na sociedade. Não era o Portugal que tínhamos querido, nem sequer um Portugal de que pudéssemos gostar. A "história" passara por nós, confusamente, deixando uma prosperidade duvidosa e uma desordem íntima e eufórica, que nos repelia e a que, de qualquer maneira, não pertencíamos. O que veio a seguir - Guterres, Barroso, Santana - não melhorou as coisas. Fora dos partidos não havia nada e ninguém aos 50 ou 60 anos se iria meter na guerra sectária em que eles se gastavam. A posição "decente", e quase unânime, estava em não se meter nessa trapalhada, fosse sob que pretexto fosse. Até porque, no intervalo, uma invasão de oportunistas, com mais força e muitíssimo mais zelo, tapava a boca e o caminho ao mínimo sinal de responsabilidade ou de inteligência. O regime de Sócrates não emergiu por acaso; emergiu desta terra já bem preparada para a corrupção e o arbítrio. Nessa altura, a minha geração só servia para propósitos decorativos. Via e lamentava o desastre que se ia preparando. Mas raramente lhe ocorreu que ela própria também era culpada.»
Vasco Pulido Valente, Público
É estranho como VPV consegue separar "a geração dele" (no fundo ele e uns seus amigos decentes...) da geração que assaltou Portugal com babosa fúria e ignorância marxista, após 1974. Fala depois nos tecnocratas - esses desalmados. Mas faz tudo parte da mesma geração; 'ele' (ainda que por pouco tempo) também foi deputado; 'ele' também andou com Soares e relatou algumas das cómicas reuniões onde se decidia a parvoíce nacional - entre copos e insultos, submissões e compadrios. 'Ele' conhece bem as coisas e as pessoas, os protagonistas. A única coisa de que se pode ligitimamente queixar é da preguiça de toda a sua geração e da dele próprio. Mas VPV (e ainda bem) tem ordenado do Estado, algum protagonismo, gabinete e terá reforma - muito mais do que a vastíssima maioria das azêmolas-pagantes, que somos nós, alguma vez poderemos sonhar ter. Desabafos. Mas ele - VPV - que não se lamente tanto, assim perto dos 70: meu Pai, com 81 anos, viu mais arbítrio, mais injustiça, mais pobreza, mais Ultramar e mais Guerra, mais mortos e mais decepados, mais mortalidade infantil, mais tropelias na administração da saúde - antes e depois do 25 de Abril, mais esperanças deitadas ao lixo, mais cordeiros transformados em lobos, mais PIDE e mais COPCON/SUV que VPV alguma vez verá; e tudo para quê? VPV apenas privou mais com políticos; muito mais...
ResponderEliminarAss.: Besta Imunda
Esta é de antologia.
ResponderEliminarPois era, mas agora é tarde. Portugal está morto.
ResponderEliminarVasco P. Valente é brilhante como interpretador da história e em geral do passado, mas o que Portugal precisa na realidade, é de bons interpretadores do presente.
ResponderEliminarComo sabemos a história não compreende a existência de "ses", mas o presente sim e é nesse ponto precisamente que as nossas elites falham redondamente.
Para dar alguns exemplos:
Necessitamos de fazer uma reorganização administrativa, aligeirar a máquina do estado.
Não estamos a fazer nada nesse sentido, num futuro algures, um historiador vai afirmar que se perdeu uma oportunidade dourada pois com a pressão da troika tudo seria mais fácil de executar, mas na verdade, agora que o presente ainda não é passado, onde está a capacidade de interpretação?
Um tribunal chegou à conclusão, passados dois anos de trabalho, que não tem capacidade para julgar um processo relativo ao sector bancário.
Daqui a uns anos, um historiador vai dizer o que se devería ter feito para que não voltassem a suceder casos como este ou parecidos.
Agora que o presente ainda não é passado, não vejo ninguem a fazer a interpretação correcta, aquela que podería alterar as coisas.
Depois da louça caír para o chão e se partir, é fácil vir dizer o óbvio, precaver o desastre é vir dizer o necessário
geração de falhados e falhanços
ResponderEliminarpaguei com com a saúde e a carteira o desastre da revolução de 74.
esta revolução socialista só tem saída para o abismo
Este texto é de um tremendo sacotear do capote da geração que conduziu a Portugal e a Europa à falência moral e financeira. Lágrimas de subcrocodilo. Não merece a tinta que se gastou para o imprimir. VPV mostra que claramente não passa de mais um intelectual arregimentado que tendo um estilo agradável nada de substantivo ou diverso tem para dizer. O ódio que ele nutre por Sócrates reflecte bem o quão ele sabe que esse personagem é uva da mesma casta. Aquela que nos governa hay mucho tiempo e que depois se terem atribuído prebendas a si próprios se consomem numa orgia incestuosa de falta de ideias enxameando os pasquins vários com pretensas análises de estilo mais ou menos confessional.
ResponderEliminarNinguém lhes passa cartão a não serem eles próprios e os outros medias eles também capturados por esta geração de bem-pensantes que nos lega um País vazio de ideias, vazio de cofres e vazio de anima.
Façam um favor a todos e sumam-se para um qualquer local favorável à vossa provecta idade. Já ninguém vos consegue suportar. Temos que pagar e ainda que gramá-los.
Poupem-nos.
Espanta-me que a lucidez notável de VPV nunca utilize o termo "suicídio" em relação ao 25 Abr.
ResponderEliminarMais que insupeito de ser " polìticamente correcto", a coisa deve radicar-se no pudor - ou em sentimentos de culpa com efeitos retroactivos...
Se por um lado é bom saber de onde viemos para saber para onde vamos, não é menos verdade que, neste momento, o texto de VPV é conversa para boi dormir.
ResponderEliminarO que realmente interessa agora mesmo é como a minha geração vai pagar a factura da irresponsabilidade das brincadeiras da geração do 25 de Abril. Pois afinal eles ainda andam por aí...
http://portadaloja.blogspot.com/
ResponderEliminarExcelente comentário do caro Besta Imunda. Morto sim, Cáustico, morto e enterrado, mas o regime é a merda do "cadáver adiado que procria". Precisa é de duas mãos de cal em cima para não cheirar mal.
ResponderEliminarAs expressões chave são "doutrina que não percebia", "emigrou", "máxima sinecura da Europa", "confusamente", "desordem íntima" e por fim "culpada".
Todo este artigo de opinião me repugna e limita-se a dar vontade de mandar à outra parte.
Merkwürdig
Um vídeo para ajudar à compreensão da hecatombe dos últimos 40 anos e do fim de Portugal como país soberano:
ResponderEliminarhttp://www.youtube.com/watch?v=OsIfeywNChg
Merkwürdig
Apenas uma nota de rodapé: a admirável geração de VPV, a do berreiro "nem mais um soldado para África", a da "descolonização exemplar" e dos socialismos para todos os gostos, esquece-se sempre das responsabilidades próprias. O que andaram a fazer durante aqueles anitos de penumbra? A fazer pelas vidinhas, pelo que se sabe e se vê. Ora, ora...
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