2.4.09

"NUNCA SE DEVE DAR PODER A UM GAJO PORREIRO*"

«No início, ninguém dá nada por eles. Mas, pouco a pouco, vão conseguindo afirmar o seu espaço. Não se lhes conhece nada de significativo, mas começa a dizer-se deles que são porreiros. Geralmente estes tipos porreiros interessam-se por assuntos também eles porreiros e que dão notícias porreiras. Note-se que, na política, os tipos porreiros muito frequentemente não têm qualquer opinião sobre as matérias em causa mas porreiramente percebem o que está a dar e por aí vão com vista à consolidação da sua imagem como os mais porreiros entre os porreiros. Ser considerado porreiro é uma espécie de plebiscito de popularidade. Por isso não há coisa mais perigosa que um tipo porreiro com poder. E Portugal tem o azar de ter neste momento como primeiro-ministro um tipo porreiro. Ou seja, alguém que não vê diferença institucional entre si mesmo e o cargo que ocupa. Alguém que não percebe que a defesa da sua honra não pode ser feita à custa do desprestígio das instituições do Estado e do próprio partido que lidera. O PS é neste momento um partido cujas melhores cabeças tentam explicar ao povo português por palavras politicamente correctas e polidas o que Avelino Ferreira Torres assume com boçalidade: quem não é condenado está inocente e quem acusa conspira. Nesta forma de estar não há diferença entre responsabilidade política e responsabilidade criminal. Logo, se os processos forem arquivados, o assunto é dado por encerrado. Isto é o porreirismo em todo o seu esplendor. Acontece, porém, que o porreirismo de Sócrates, pela natureza do cargo que ocupa, criou um problema moral ao país. Fomos porreiros e fizemos de conta que a sua licenciatura era tipo porreira, exames por fax, notas ao domingo. Enfim tudo "profes" porreiros. A seguir, fomos ainda mais porreiros e rimos por existir gente com tão mau gosto para querer umas casas daquelas como se o que estivesse em causa fosse o padrão dos azulejos e não o funcionamento daquele esquema de licenciamento. E depois fomos porreiríssimos quando pensámos que só um gajo nada porreiro é que estranha as movimentações profissionais de todos aqueles gajos porreiros que trataram do licenciamento do aterro sanitário da Cova da Beira e do Freeport. E como ficámos com cara de genuínos porreiros quando percebemos que o procurador Lopes da Mota representava Portugal no Eurojust, uma agência europeia de cooperação judicial? É preciso um procurador ter uma sorte porreira para acabar em tal instância após ter sido investigado pela PGR por ter fornecido informações a Fátima Felgueiras. Pouco a pouco, o porreirismo tornou-se a nossa ideologia. Só quem não é porreiro é que não vê que os tempos agora são assim: o primeiro-ministro faz pantomima a vender computadores numa cimeira ibero-americana? Porreiro. Teve graça não teve? Vendeu ou não vendeu? Mais graça do que isso e mais porreiro ainda foi o processo de escolha da empresa que faz o computador Magalhães. É tão porreiro que ninguém o percebeu mas a vantagem do porreirismo é que é um estado de espírito: és cá dos nossos, logo, és porreiro. E foi assim que, de porreirismo em porreirismo, caímos neste atoleiro cheio de gajos porreiros. O primeiro-ministro faz comunicações ao país para dizer que é vítima de uma campanha negra não se percebe se organizada pelo ministério público, pela polícia inglesa e pela comunicação social cujos directores e patrões não são porreiros. Os investigadores do ministério público dizem-se pressionados. O procurador-geral da República, as procuradoras Cândida Almeida e Maria José Morgado falam com displicência como se só por falta de discernimento alguém pudesse pensar que a investigação não está no melhor dos mundos... Toda esta gente é paga com o nosso dinheiro. Não lhes pedimos que façam muito. Nem sequer lhes pedimos que façam bem. Mas acho que temos o direito de lhes exigir que se portem com o mínimo de dignidade. Um titular de cargos políticos ou públicos pode ter cometido actos menos transparentes. Pode ser incompetente. Pode até ser ignorante e parcial. De tudo isto já tivemos. Aquilo para que não estávamos preparados era para esta espécie de falta de escala. Como se esta gente não conseguisse perceber que o país é muito mais importante que o seu egozinho. Infelizmente para nós, os gajos porreiros nunca despegam.»
Helena Matos, Público*

15 comentários:

  1. Uma análise, aos tempos que correm, simplesmente soberba.

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  2. Antológico.
    Lamentação em surdina : que pena o PR não ler jornais (ou, pelo menos, esta JORNALISTA)...

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  3. Baudolino2:09 p.m.

    vem-me à ideia o delicioso "Discurso sobre o filho-da-puta", do Alberto Pimenta, hehe, vou relê-lo;

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  4. Esta gente porreira
    sempre tão popular,
    parece muito guerreira
    mas é só história de embalar!

    Da popularidade são viciados,
    idolatrando as aparências,
    os seus ideais anunciados
    são de fúteis incoerências!

    O mexilhão amedrontado
    pelo nacional porreirismo,
    tem o seu orgulho maltratado
    por este falso moralismo!

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  5. Porque razão não se abre já uma comissão de inquérito ao que se está a passar? Afinal, no caso BPN, temos ficado a saber mais com ela. os bons exemplos são para seguir. Vote aqui:
    http://aoutravarinhamagica.blogspot.com/2009/04/um-elogio-e-uma-premonicao.html

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  6. Anónimo3:05 p.m.

    É um artigo porreirissimo.Mas o Gajo para ser mesmo porreiro já se devia ter demitido há muito tempo.Como não despega vamos ser ainda mais porreiros e dar-lhe um valentissimo chuto no cu.Porreiro,pá!

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  7. Suponhamos3:51 p.m.

    Brilhante este artigo de Helena Matos. Vergonha é o que esta gente que nos governa deveria ter mas isso é pedir demais.
    Pela primeira vez em 30 anos com direito a voto, estou firmemente disposto a não votar. Esta gente não merece a nossa confiança e muito menos a nossa complacência, quase acéfala, para actos de extrema gravidade que ninguém controla nem fiscaliza.
    Queixavam-se da ditadura, conseguem ser piores do que ela embalando-nos com a conversa do estado de direito e da democracia, palavras que, estou certo, a maioria deles nem sabe exactamente o que significam.
    Estamos entregues à bicharada caro João. Não sei como poderemos sair disto!...
    Cumprimentos.

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  8. Ana de Vasconcelos4:48 p.m.

    Parabéns pelo artigo e espero que os tipos porreiros leiam este artigo porreiro!

    E minha querida Helena Matos, tenha cuidado...não vá os tipos porreiros do Ministério Publico não terem que fazer e ainda lhe metem um processo por injurias e difamações.

    Cumprimentos
    Ana de Vasconcelos

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  9. Anónimo6:55 p.m.

    Porreiro, pá!

    O problema do porreirismo leva este País ao fundo, mesmo sem este gajo porreiro. Alíás, o tipo não é assim tão porreiro, pois o ser porreiro implica alguma ética.Por isso, ao não ser verdadeiramente porreiro, não passa a ser recomendável... Como sabemos. Todos.

    PC

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  10. Anónimo7:09 p.m.

    A Helena Matos não vai em porreirismos e zás. Com mais jornalismo deste quilate, frontal, sem medo, isto vai: não é a bomba, mas pode ser o detonador.

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  11. Pela primeira vez em 30 anos com direito a voto, estou firmemente disposto a não votar.

    Com o devido respeito, é por isto e outras coisas que o "gajo porreiro" muito provavelmente lá ira ganhar as eleições.

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  12. Anónimo8:25 p.m.

    Muito bem visto HMatos, parabéns pelo s/texto.
    Eu tb já "disse" o mesmo(ms n tão bem escrito,é claro!)em vários comentários neste blog.
    Concordo com o novo vocábulo:PORREIRO/ISMO.
    É mesmo giro e,obviamente,politicamente mais correcto!!!
    Doravante,vou usá-lo para tudo e para todos qdo me irritar com esta corja toda da política.
    Assim em vez de dizer:seu grande"ladrão","mentiroso","paneleiro","cabrão","filho-da-puta","burranca","parolão",direi antes:
    «seu grande PORREIRO»!!!
    Pelo menos não poderão dizer(a menos q se faça jurisprudência sobre o caso)que há injúria ou difamação.E esta hein?!
    Ficamos assim mais "polite's",fazemos boa figura e gozamos o prazer de zurzir nessa gentalha toda sem haver um único INSULTO TRADICIONAL.
    Midarte.

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  13. Anónimo10:30 p.m.

    Séra por isto que este blog se chama Portugal dos Pequeninos? As pessoas não crescem!

    Os Portuguêses têm escolhas e elas começam ao nível das autarquias, porque é que não votam por pessoas idónias e eliminam o lixo desde essa altura?

    Um exemplo da cupidez/estupidez do Português, o caso Fátima Felgueiras em Felgueiras. Que mais queréis? Mea Culpa, Mea Culpa...atirem as albardas fora!

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  14. Anónimo1:12 p.m.

    A acrescentar ao m/comentário anterior,vai só mais uma coisita:
    Também vou usar a palavra PORREIRISMO qdo quizer dizer o que os GOVERNANTES/AUTARCAS fazem à custa do ESTADO:"sacanagem","processos-de-intenções","perseguições","tráfego-de-influências","corrupção","subornos","peculatos","enriquecimento-sem-causa","favorecimento-de-negócio","taxos-p/VARAS-de-amigos-ColaCartazes".
    É espantosa esta inovação:como é que duas simples paravrinhas:«porreiro»e a sua derivada «porreirismo», conseguem esta extraordinária síntese vocabular!
    Parece que a ideia da HMatos acaba de dar o mote p/se construir um DICIONÁRIO SIMPLEX,associado(diga-se que com toda a propriedade)ao SOCRETISMO ... melhor dito ao PORREIRISMO !!!
    Midarte.

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  15. Uma análise que nos deixa ficar a todos nós uns verdadeiros tipos porreiros, como quem diz: valerá a pena lutar contra esta enchurrada que já nos levou os anéis todos, mas pior ainda, nos levará também os dedos?
    Então seremos felizes para sempre, não metendo bedelho ou a mão no prato, porque, enfim, nessa altura estaremos todos manetas...

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