31.1.10

COELHÊS

O dr. Jorge Coelho, o eterno "ideólogo" do PS mesmo na presente encarnação de betoneiro, disse que "não há ninguém com peso para pôr ordem nisto". Se escrevesse isto aqui, vinha imediatamente a patrulha anti-fascista apodar-me de salazarista para baixo. Sucede que o dr. Coelho raramente fala por acaso. Dá ideia que está farto de Sócrates, alguém que ele "gerou" ordenando a outros que esperassem a sua vez. Em "coelhês", Sócrates não tem "peso". Nem já para governar, quanto mais para outros voos. Daí o apoio a Alegre, igualmente manifestado em "coelhês". Tudo indica que esteja em curso uma espécie de mutação genética dentro do "socratismo". Para quê, em breve saberemos.

FORA DE HORAS

Manuel Alegre vai andar um ano inteiro a alimentar almoços e jantares? Quando chegar a hora, já ninguém o pode ouvir.

ACTUALIZAÇÃO DO PRINCÍPIO DA CARIDADE



A partir dos 51 segundos: «quando eu subi aos céus/disse p'ra todos os mortais/fodam-se vocês agora/que a mim já não me fodem mais.»

PALANQUES


No espaço de pouquíssimas semanas, Cavaco Silva, pela pena de Vasco Pulido Valente - e, presumivelmente, sempre com a mesma vassoura engolida - já teve várias encarnações. Começou por, «na ausência de uma oposição, tem ele de substituir a oposição. Portugal inteiro espera isso dele. E, depois, quando Sócrates cair, como cairá, na execração geral e ele, Cavaco, reeleito, reentrar em Belém, se tratará de pôr a casa em ordem.» Depois continuou. «Na balbúrdia estabelecida, há uma única personagem em quem até certo ponto os portugueses confiam: Cavaco. Manuel Alegre não se enganou. A opinião, essa opinião que as sondagens nunca reflectem, é marcadamente antiparlamentarista e antipartidária. No que ele se engana é em atribuir esta perversidade só à direita. Ele mesmo, com a sua independência do PS e as suas relações com o PC e o Bloco, prova o contrário. A candidatura que anunciou no Algarve não é uma candidatura da esquerda, é uma candidatura acima da esquerda, a candidatura da gente desiludida com os partidos, que procura uma nova solução, ou seja, como a de Cavaco, com uma lógica presidencialista.» Muito bem. Todavia, hoje, Pulido Valente, presumivelmente num acesso soarista-parlamentarista, teme que o mesmo Cavaco das notas anteriores «reúna os poderes fundamentais da República» e sugere que Alegre (o mesmo Alegre das notas anteriores) "congregará" os bonzos «contra qualquer veleidade de estabelecer uma autoridade que materialmente altera a Constituição do regime.» Só estranho que VPV não tivesse mencionado, também a título de benemérito anti-congregacionista contra Cavaco, o candidato oficial do PS a Belém. O guião das cerimónias do banqueiro Santos Silva até foi alterado para ele poder falar no palanque.

30.1.10

O QUE É QUE O PS FRANCÊS HÁ-DE FAZER COM AQUELA GALINHA CACAREJANTE?

«Começando a ser evidente que Sarkozy sofre da doença bipolar [nota pessoal: ainda não "desisti" de Sarkozy], é muito possível que Villepin, um fiel partidário de Chirac, seja candidato à Presidência da República nas próximas eleições em 2012, e até que as ganhe, caso o candidato socialista volte a ser aquela galinha cacarejante que dá pelo nome de Ségòlene Royal.»

Do Médio Oriente e afins

O CENTENÁRIO


O "centenário" da república começa a ser comemorado este fim de semana. No Porto, as hostilidades foram abertas por uma palhaçada promovida por Norberto Barroca que desceu (ou subiu, pouco interessa) uma rua por causa do "31 de Janeiro". Nada mais justo. O "31 de Janeiro" de 1891 não passou disso mesmo, de uma palhaçada em torno da "questão inglesa". Meteu sargentos, um capitão, um tenente, um alferes, actores, eminências da "cultura", afinal as quadrilhas habituais do então PRP já aí desavindas. A peripécia durou umas horas, as suficentes para hastear uma bandeira na câmara municipal e fomentar um pequeno folclore circunstancial. Tudo acabou tipicamente a tiro e em prisões várias. Como escreve Rui Ramos na História de Portugal da foto, a república destes aventureiros rebeldes ao directório do PRP «não resistiu um par de horas à Guarda Municipal» até porque a oficialidade tinha mais com que se maçar. Cavaco preside daqui a umas horas à abertura das "comemorações" que, para mim, só têm um interesse. Politicamente, a um ano de eleições presidenciais em que desejo que Cavaco se recandidate, estes festejos vêm a calhar. Muitos porventura prefeririam que fosse outro a presidir às festanças. Azar deles.

DE CERTEZA


Parece que os tipos dos carroceis andaram por Lisboa a buzinar com uns dizeres à altura nos camiões. Um exibia um pano onde se podia ler "Salazar volta que estás perdoado". Há para aí uns anitos que está, de certeza.

SAFA


A conversa - jornais, paineleiros, televisões, rádios, blogues, twitter, etc., etc. - sobre o orçamento já enjoa. É mesmo coisa de latino-americanos armados. Adoptem antes gado asinino. Safa.

29.1.10

O LAMENTÁVEL BLAIR


Blair - aquela sinistra figura de sorriso idiota que inspirou a "esquerda moderna" - foi a uma comissão de inquérito dar pseudo explicações sobre a guerra do Iraque. Ele, disse, acreditava piamente que havia armas de destruição maciça no Iraque, a falácia e o pretexto para a invasão. As imagens patéticas de Blair a dizer isto mostram não um herói ocidental mas um cínico desavergonhado. Por muito menos, outros são ouvidos nessa duvidosa instituição de direito internacional que é aquele Tribunal de Haia. Só porque passa por ser democrata é que Blair não senta o rabinho por lá?

A ENTIDADE EM FORMA DE ASSIM

«A ERC começa 2010 como acabou 2009. Abriu 2009 dizendo que não analisaria o caso Sol-Freeport. Não interessava ao Governo. Acabou 2009 obrigada pelos acontecimentos a analisá-lo - ou fingindo analisá-lo: o presidente da ERC declarou no Parlamento, sobre este caso, que não consegue "melhorar o tempo de decisão da ERC", uma maçada. Em 2009, o mesmo Dupond defendeu, qual Sócrates, que se deve "reagir violentamente" nos media contra os media. Foi mais uma de várias intervenções egocêntricas e desajustadas. Em 2009, a ERC anunciou, após os ataques de Sócrates à TVI, que iria "averiguar" o JN6ª. Para abrir caminho ao Governo, a ERC fez então o inimaginável numa instituição de regulação em democracia: condenou o estilo jornalístico, sem encontrar motivos profissionais ou éticos para criticar o noticiário. Sócrates conseguiu acabar com o JN6ª, e a ERC esperou pelo fim do processo eleitoral para chorar lágrimas de crocodilo. Em 2009, a ERC anunciou querer regular os rodapés das TVs. O mundo aguarda o cumprimento dessa missão imprescindível à humanidade. Em 2009, a ERC inventou uma trapalhada para chumbar as propostas para um quinto canal, por Sócrates já não estar interessado nele. Antes das eleições de 2009, a ERC propôs-se censurar os espaços de opinião dos media portugueses. No final de 2009, preparou uma futura decisão frouxa sobre a pressão política na TVI ao anunciar "não ter meios" para lidar com o caso. Desconhece-se que "meios" lhe faltam, mas provavelmente é a independência de decisão. Tudo o que a ERC fez, fez mal? Não. Encomendou bons estudos a instituições universitárias. É uma pena a regulação não ser também feita por entidades exteriores à ERC.»

Eduardo Cintra Torres, Público

AO CUIDADO

De Pedro Santana Lopes, esta mistificação tipicamente "à portuguesa".

SER E ESTAR


Medeiros Ferreira tem razão. O PSD aproxima-se da sua Walpurgisnacht sem nada de substancial para imolar a não ser a si mesmo. O país não entende as boas investidas parlamentares de Ferreira Leite seguidas da complacência abstencionista a bem da mercearia e do sossego, independentemente da circunstancial bondade compassiva. Rangel já tinha dado amplos sinais de que prefere a confortável burocracia política de Bruxelas (uma preferência que, cá dentro, ninguém lhe agradecerá) à ruptura reformadora doméstica. Provavelmente não terá uma segunda oportunidade tão cedo. Aguiar-Branco conta pouco embora não tenha amigos à altura que lho expliquem. Neste contexto, cada nome retórico que emerge contra Passos é cada vez mais apenas isso mesmo, um nome como outro qualquer apenas lançado porque há Passos Coelho. Marcelo é o espelho televisivo desta original "doutrina". Por este caminho, Passos passará de mero ser a estar quase por direito natural. E a culpa jamais será dele.

A ÚLTIMA FEROCIDADE

«O Orçamento é de ponta a ponta o Orçamento de Sócrates. Não diminui a despesa corrente primária (42 por cento do PIB como em 2009). Nem sequer se fala da reforma do Estado, como se ele de tão perfeito já não precisasse de emenda. As PPP da megalomania instituída sobreviveram em nome da perene "modernização" de Portugal. E o Orçamento (um Orçamento de rotina e mercearia) ele próprio se declara "de confiança", quando, excepto a de Sócrates no incomparável talento do primeiro-ministro, a confiança é a mais rara mercadoria do país. Falta acrescentar que se congelaram os salários da função pública. Um gesto quase fútil e, provavelmente, a última ferocidade do "animal feroz". »


Adenda: Em tempos de rugidos timoratos, o sr. Assis, aquela pérola que dirige o bando parlamentar do PS, foi dizer aos camaradas de Sintra que "Cavaco é derrotável". Presumo que o sr. Assis se esteja a referir delicadamente ao Chefe de Estado. Sucede que, mais do que derrotável, o sr. Assis foi humilhantemente derrotado numas eleições à câmara do Porto. Talvez lhe conviesse mais o silêncio do que a histeria, uma especialidade que distingue a sua vã eloquência.

28.1.10

I ONLY WISH


«O melhor do socialismo é [est]a falta de ontem. Como eu os invejo. Deve ser tão mais fácil viver sem ontem.» Rodrigo Moita de Deus numa inconsciente mas feliz metonímia de Lewis Carroll:" I only wish I had such eyes,' the King remarked in a fretful tone. `To be able to see Nobody!"

DA PENSÃO AO CORTESÃO

Quando um académico e um literato se louvam no "24 horas" revelam mais sobre o país que os fez respectivamente académico e literato do que todas as "pensões" da dra. Ferreira Leite juntas.

O PERTINENTE MACHADO


Ontem, enquanto degustava (que verbo mais idiota) um "cozido à portuguesa", apareceu no "lcd" (uma coisa ainda mais idiota) do restaurante o senhor Manuel Machado que esteve mais para lá do que para cá. Foi salvo, no hospital do Funchal, dos resultados de uma operação manhosa o que prova que existe mesmo qualidade de vida na Madeira. Não conheço o senhor Manuel Machado de lado algum, mas ficará para sempre gravado na minha mona como o homem que proferiu a frase mais pertinente dos últimos tempos. Um vintém é um vintém tal como um cretino é um cretino. Saúde, senhor Machado, saúde.

TUDO GENTE BOAZINHA

De facto, já li Le Candide há mais de um dia e lamento-me quase todos os dias por não ter sido sempre à distância do dia anterior. Se alguém entendeu, com isto , que estou preocupado com quem cruza a perna e onde o faz, continue, pois, a "dar safanões" a quem achar conveniente. E quanto ao elogio à minha retórica de imitação, tentarei não desapontar, prevendo, desde já, um rotundo falhanço.

"A BANALIZAÇÃO DO MAL"

Para além de um link macio, fica-se sem perceber se "tmr" já ouviu falar de Hannah Arendt.

O "DITADOR" QUE DÁ TRABALHO


Há muitos anos, por causa de um trabalho num concurso profissional, li Os grandes patrões da indústria portuguesa, de Maria Filomena Mónica (à direita, na foto). São entrevistas a alguns desses "patrões" precedidas de um notável texto da autora agora aparentemente mais interessada em republicar-se do que em escrever "originais". O que é uma pena. Ali, um desses "patrões" era Belmiro de Azevedo, com a Sonae por "modelo", que utilizei no referido trabalho. Desta vez, Belmiro deixa-se entrevistar para não dizer nada. Ou, melhor, para ser engraçado que é um estado de alma muito apreciado por aí. Mesmo assim, as frases que os media respigaram não fazem justiça ao que Belmiro disse na íntegra. Caricaturá-lo a partir delas e, por tabela, "etiquetar" este ou aquele é insuficiente. O homem, à nossa é à sua medida, é um rei. E um rei com sotaque que esconde outro na barriga e que dá trabalho a muita gente. É quanto basta.

O QUE É QUE SE HÁ-DE FAZER COM ESTA EUROPA?


Manuel Maria Carrilho "lê" Hubert Védrine. Védrine, importa salientar, é de um tempo em que a Europa era viva. E a França também.

27.1.10

O VALE ESCURO


«Num lugar como este faltam as palavras, no fundo pode permanecer apenas um silêncio aterrorizado um silêncio que é um grito interior a Deus: Senhor, por que silenciaste? Por que toleraste tudo isto? É nesta atitude de silêncio que nos inclinamos profundamente no nosso coração face à numerosa multidão de quantos sofreram e foram condenados à morte; todavia, este silêncio torna-se depois pedido em voz alta de perdão e de reconciliação, um grito ao Deus vivo para que jamais permita uma coisa semelhante.»

Bento XVI, Aushwitz-Birkenau, Maio de 2006

OS AMIGOS DE PENICHE

«Por todo o lado: Grupo Espírito Santo, através de um fundo imobiliário, é o proprietário do terreno que desabou para a CREL na sexta-feira», José Manuel Fernandes no twitter. E "ameaça" o senhor Salgado com o abandono do país por parte de "colegas", i.e., banqueiros por causa da tributação (coitadinha dela) sobre eles.

O REGRESSO DOS MAUS RAPAZES - 2


O Público apresenta hoje um artigo cientifico que diz que "estão a criar-se rapazes frustrados". O fenómeno refere-se ao ensino e ao emprego. Interessa, pois, puxar pela cabeça: o sexo feminino assume hoje uma predominância no meio académico e, por consequência, uma cada vez maior efectividade de funções nos cargos de topo privados e públicos. Até aqui tudo bem se, como acontece, isto não fosse o efeito adjacente a uma suposta "cultura de igualdade". Como sugerem cientistas devidamente creditados, o fenómeno aparece no seguimento de uma total inversão da "prova do crime". Simplesmente, e com exagero, virou-se o bico ao prego e, naturalmente, a igualdade continuará sem existir mas desta vez ao contrário. Como se fosse uma moda. Chegará uma altura, como também é costume na História, em que vai voltar-se atrás. Estupidamente, existirá por certo um revivalismo do machismo e do modo masculino de gerir institucional e familiarmente porque irão surgir ideias ridículas de que as mulheres estragaram tudo pelo facto de serem mulheres e não porque o que levou a que as mulheres aparecessem de outra forma não tenha sido mais do que a alimentação de um preconceito contra elas próprias, indirectamente, e directamente contra os homens no padrão da actualidade. Com efeito, não adianta andar muito preocupado porque, com mulheres ou com homens, o que conta são cabeças e essas continuarão a ser tão medíocres ou tão espectaculares como antes foram. Se os homens estão preocupados com as suas cada vez mais diminuídas oportunidades, é da maneira que passarão a existir grandes homens na proporção que sempre existiram grandes senhoras.
Fora isto, convém acrescentar que a mulher é muito mais perspicaz do que o homem, principalmente se se comparar a mulher média com o homem médio. Basta andar na rua e perceber que meninas de 13 anos conseguem perfeitamente mascarar a sua idade física e mental em comparação com rapazes que só têm interesse, quando o alcançam, para lá dos vinte anos. Também é curioso notar que, enquanto os rapazes andam entretidos no surf, na playstation, nas gajas, nas bebedeiras, ficando-se por aí, elas, ao mesmo tempo que dão para todos esses peditórios same age, percebem rapidamente o ascendente que a sensualidade tem em tudo o que mexe para lá da sua geração e, além disso, também percebem mais instintivamente que, afinal, a vida pública é muito mais feminina do que masculina no sentido em que a vida pública vive de intriga.

O GOSTO PELO FOLCLORE

Esta conversa é um pastiche do que é o "literato" português contemporâneo e do que é o "jornalismo cultural" perpetrado por cá em jornais e revistas, salvo uma ou duas honrosas excepções. E basta uma frase para resumir o paupérrimo exercício. «Em valter, não sobra nada de Salazar. Talvez sobre o fado, "que ele promoveu e abraçou", ou o gosto pelo folclore.» Ou, podia perguntar-se ao "valter" e aos candidatos a "valter", o que é que ainda hão-de fazer com o "fascismo"?

Adenda: Por falar em folclore, há o outro Valter, com maiúscula, o Lemos. Como nota um leitor, «Valter Lemos, ex-secretário de Estado da Está-na-Hora-Está-na-Hora-De-a-Ministra-Se-Ir-Embora, anunciou solenemente que não apoiará uma candidatura presidencial de Manuel Alegre. Consta que Alegre ficou extraordinariamente preocupado.»

TALVEZ NÃO


«É necessário melhorar o combate à corrupção», disse o conselheiro Pinto Monteiro por ocasião da abertura regimental do ano judicial e de quem, entre outros, depende o dito combate. Dito assim, até parece que o conselheiro Pinto Monteiro não é o PGR. Tal como, dada a elevação do momento retórico reiterado anualmente, parece que o presidente do STJ não é presidente do STJ e que os agentes políticos que oficiam na cerimónia não são agentes políticos. Há demasiada "teoria" acerca da justiça e a justiça é cada vez mais injusta. Um mistério. Ou talvez não.

O REGRESSO DOS MAUS RAPAZES


Este artigo - que resulta de trabalhos de investigação académica sobre o assunto - parece sugerir que os meninos e as meninas deviam estudar separadamente. Quando comecei "à escola", não havia preocupações de "género", um termo que apareceu recentemente não fossemos nós não reparar em pessoas que gostam de exibir que são isto ou aquilo. Aos poucos, o Estado optou por juntar tudo e, apesar da extravagância dos primeiros tempos, a presença feminina nas universidades impôs-se. As moças perceberam rapidamente a vantagem da foçanguice numa sociedade dominada pelos equívocos do "mérito". E os moços não perceberam que a retórica da igualdade pendia inevitavelmente para um lado e que esse lado, o gineceu, tomou conta de quase tudo. Não é apenas a disciplina (ou a falta dela) que explica tudo. As moças há muito que não de distinguem por serem "prendadas" ou exímias em "lavores femininos". Algumas até podem ser loiras e burras mas serão infinitamente menos frívolas do que eles. Onde eles desistem, elas persistem. Onde eles caem, elas levantam-se e prosseguem de saltos altos ou sapatilhas Timberland. É por isso que a balança da igualdade se desequilibrou sem remédio. Ninguém permite mais que se trate o igual de forma e igual e o diferente de forma diferente. O título do artigo - "vem aí uma geração de rapazes frustrados" - esconde uma falácia. É que eles já são frustados. E elas já perceberam.

FORA DO MOSAICO

Neste mosaico de livros, há dois autores portugueses. O morto é um grande morto e o livro é um belo livro escrito na nossa língua. Ça va de soi. O vivo está simplesmente vivo o que já não é mau. Só não percebo por que é que está "mais vivo", enquanto autor da mesma editora, do que Passos Coelho que "saiu" ao mesmo tempo dos outros e que, parece, não se anda "a sair" mal.


Adenda (à adenda): Mas eu não sou candidato a nada. Apenas notei a falta do nosso jovem Passos num universo onde há tantos candidatos a escritor que ainda usam cueiros e que,mesmo escritores um dia, não deixarão os cueiros. Nem tu imaginas quantos e quais. E o intuito foi mesmo o literal: não o deixar de fora, sem ironias. Quando é para usar o usar o pingalim, é mesmo para usar o pingalim. Ou não tivesse eu convivido com a arma de Cavalaria.

A DANAÇÃO DE DAMMANN



No corredor do Coliseu encontro alguém que me diz que cancelaram uma coisa qualquer da medíocre temporada lírica em curso no São Carlos. E porquê? Porque prosaicamente faltou o tenor. Ora sou do tempo em que, com Paolo Pinamonti (e, antes dele, com os directores que conheci, de Paes a Serra Formigal, de Ribeiro da Fonte a Ferreira de Castro), se fazia o trivial, uma substituição. Num ano, 1982, Cossotto estava anunciada para uma Carmen e foi substituída por uma jovem e genialmente inesperada Victoria Vergara que deu ao São Carlos uma das melhores heroínas de Bizet de sempre. A escolha do encriptado Mário Vieira de Carvalho para o TNSC, o alemão Christoph Dammann, foi das coisas mais catastróficas que atingiram o coração do nosso único teatro de ópera, um teatro nacional. Gabriela Canavilhas, a actual titular da Cultura, tem a estrita obrigação de perceber isto sobretudo por causa da sua formação. E se não perceber, a evidência fala por si. Remova Dammann - e outras figuras menores - e reponha Pinamonti. Sou dos poucos à vontade para defender isto. No mesmo corredor e na mesma conversa participou o Prof. Jorge Miranda, um espectador com assinatura antiga no São Carlos. Tenciona acabar com ela. Moral da história: "acabem" com Dammann antes que ele acabe com o São Carlos.

Clip: Abertura Egmont, Beethoven. Georg Solti. 1996. Em resposta a um leitor, o concerto foi fraquinho. Gardiner esteve bem melhor no dia de ano novo em Veneza, no La Fenice, que acompanhei no canal Mezzo. Notava-se que a orquestra anda em "digressão artística". Maria João Pires foi Maria João Pires, nem mais nem menos.

O FARDO

Enquanto o ministro das finanças explica em directo as provações para 2010, passa em rodapé que o governo português vai emprestar €140 milhões a Angola. Isto afinal está mais robusto do que parece.

26.1.10

SEM DESCULPAS

Um pouco na sequência do post anterior, constata-se que o CDS, sempre na peugada do PSD (e do governo), também vai apresentar duas tretas quaisquer sobre a lei das finanças regionais. Pela voz da dra. Cristas (a nova Teresa Caeiro do dr. Portas em versão quinhentas vezes mais ambiciosa), ficou a saber-se que «pensamos (pensa ela) que não são devidos à Madeira quaisquer montantes a título retroactivo.» Por acaso pensa mal mas alguém lhe explicará porquê. Depois, como ganharam uns votinhos nos Açores, a dra. Cristas quer «que os Açores não fiquem prejudicados com qualquer alteração legislativa» e, à falta de uma "iniciativa", junta duas para a gente não se esquecer que existem. Todavia, insuflar a questão "finanças regionais" nesta altura do campeonato - seja por causa da Madeira, seja por causa dos Açores - é um manifesto disparate que o país não entenderia e que Sócrates iria explorar à exaustão. Nunca pensei escrever isto, mas deixem-no trabalhar sem desculpas.

RESPONSABILIDADE SOCIAL

Lê-se aqui que “o CDS conseguiu marcar a agenda das negociações”, em oposição ao PSD, como se o CDS fosse alguma coisa e como se o que passa nas televisões fosse o que marca. Sucede que o CDS não marca coisa nenhuma a não ser aos olhos da mediania. Presumir ou dar a entender que esse partido tem intervenção e não é só mais do que um vácuo, não passa de uma amabilidade demasiado sistémica e um derrame já habitual em forma de artigo definido. Enfraquece-se permanentemente o PSD, que é o que interessa que se componha, e puxa-se a ferros o que não interessa para nada. É a aclamada responsabilidade social.

INTERLÚDIO MUSICAL


No Coliseu, às 21, John Eliot Gardiner dirige a Orquestra Sinfónica de Londres. O programa é apenas Beethoven, o Concerto nº 2 para piano e orquestra - o piano fica com Maria João Pires - e a Sinfonia nº 6, dita Pastoral.

25.1.10

FÁTIMA, O SINTOMA

A D. Fátima promove mais um dos seus infinitos episódios desta vez acerca das "contas do estado". Ainda não entendeu que ela é um tipicamente um sintoma do "estado a que isto chegou". Boa noite e boa sorte.

VAMPIROS

Agora que dois canais generalistas decidiram, em telenovelas, decantar a original "temática" dos vampiros - tudo por causa de uns livros de capa negra de uma "Rodrigues dos Santos" qualquer lá de fora -, a RTP preferiu "concorrer" com o eterno dr. Soares que nos vai brindar com oito programas sobre o maravilhoso centenário da República. Só vampiros, na realidade.

UM HOMEM CONTRA AS BENEVOLENTES


O General Ramalho Eanes celebra hoje setenta e cinco anos. Num ano em que as benevolentes falam de eleições presidenciais como se tivessem lugar já amanhã - elas estão sempre com um olho no burro e outro no cigano e a sua "história" dura menos de um dia - apraz-me saudar o bom peso do passado. E é apenas isto, escrito noutra ocasião. À medida que decorre incessantemente o pior - pessoas, circunstâncias, instintos -, mais a imagem desse homem austero e decente se me afigura exemplar. Eanes foi o primeiro presidente eleito por sufrágio universal, directo e secreto. Tinha quarenta anos. Com o poder de que então dispunha - político e militar - podia ter sido tudo e feito tudo. Fez, porém, o essencial preservando a liberdade.

BETONEIROS DA OPINIÃO

Há relativamente pouco tempo, como uma tendência da moda, assiste-se a um fenómeno curioso. Nos jornais, nos blogs e nas televisões, quem bota faladura emprega insistentemente o artigo definido "o" ou "a" para fazer referência a alguém. O objectivo é claro e um bocadinho piroso. Na verdade, os betoneiros da opinião referem-se uns aos outros publicamente, para que o simples leitor ou espectador perceba que está fora do círculo, com a intimidade de quem todos os dias troca uns telefonemas ou umas mensagens no facebook ou no twitter sobre o dia noticioso e as suas merdinhas laterais. Fechada essa jaula que aparentemente divide a prestigiada gente livre do outro que é suposto estar a assistir ao seu derrame, o artigo definido serve para fazer do referenciado na "opinião", ora um vagabundo, que é raro, ora uma espécie de entidade à prova de bala. O que interessa, em última instância, é perceber-se que quem escreve está à distância simples da sua vontade do mencionado, seja pela "amizade" ou por qualquer vontade de "entendimento" ou "partilha intelectual" quando se tratam nomes externos ao pequeno ambiente doméstico. Coitados, que estúpidos.

A FANCARIA



Sophia Loren, reaparecida em 2009

Em alguns sítios de Lisboa, mais do que no Porto que mantém um certo nível em certo tipo de círculo, ir à missa é como ir a um vernissage qualquer com a Caras ao dependuro. Está-se, nos tais certos sítios, na igreja em função de um compromisso de vaidade e cusquice. Em certos sítios de Lisboa, entremeia-se a Eucaristia com o cinismo mais reles de todos. Em certos sítios de Lisboa, as senhoras, e algumas até parecem senhoras, cruzam a perna na igreja sem saberem, entre uns casacos de pele e uns cabelos armados sem elegância, porque nunca lhes ensinaram, que as senhoras cruzam a perna em todo o sítio menos na igreja. Estas mesmas senhoras, devem saber de cor os livros de etiqueta que há à venda por aí. Em certos sítios de Lisboa, dá vontade de ir ter com algumas caras e perguntar-lhes se as viagens que fazem, principalmente as que não são de mochila às costas, não servem para nada. Às vezes, em certos sítios de Lisboa, dá vontade de perguntar se, numa ida a Paris, a Londres ou até ao Mónaco, aquelas criaturinhas que tanto apreciam frivolidades, não têm inteligência suficiente para as transportar adequadamente para a nossa cidade e conseguir tornar Lisboa uma terra menos provinciana e que consiga captar gente que liberte a cidade do grotesco corredor social que nela pulula sem graça nem categoria nenhuma. Mais do que em certos sítios de Lisboa e na cidade quase toda, é impossível ser-se complacente. Não há nada mais irritante e meão do que a complacência, para além de gente que se acha e não tem por onde achar-se.

SINAPSES E LÁBIOS

O problema é que, ao vivo, o Vasco não é «tragicamente concebível» e nem sequer é um upgrade do bardo Mendes Bota. É apenas um bom rapaz impressionado pelo "estilo Nuno Homem de Sá que consegue sorrir sem mexer o lábio superior" do proto-líder que ele apoia.

INTENDÊNCIAS

Com indiquei na altura em que abri o blogue a colaborações, os colaboradores tanto podiam vir como ir. Tiago Moreira Ramalho (TMR) esteve e já foi. Em breve outro virá e, espero, sob a forma aforística. TMR abriu este blogue de que é autor exclusivo. Começa com o orçamento. O problema é que se tem falado muito em orçamento como se se tratasse de uma iniciação maçónica. Todos querem saber como é mas poucos se atrevem a experimentar. O OE deve passar? Deve e, de preferência, com pouca conversa porque há muito para fazer. E convém lembrar que é uma lei do parlamento, i. e., da "representação nacional". É de todos e não é de nenhum. Neste sentido, releva mais neste momento do que uma qualquer lei de finanças regionais. Se o PSD não perceber, o Doutor Cavaco que lhe explique.

24.1.10

UM SALAZAR VERMELHO


O António, que colabora neste blogue, ofereceu-me um busto vermelho como os três da foto (ele tem um azul). O seu autor é Francisco Mota Ferreira. Salazar - é bom afirmá-lo no ano do folclórico centenário - era um republicano. Católico, aceitou, ao contrário de outros católicos monárquicos, ser deputado após as "legislativas" de 1921. De resto, como correspondência recentemente editada evidencia, Salazar até enviou retratos para passes de comboio a que teria direito como deputado - e "que me estão fazendo muita falta" - designadamente porque prometeu "acompanhar um amigo num passeio pelo Minho que me ficará muito caro se nessa altura não tiver o passe". Entretanto ocorreu mais uma peripécia sanguinária típica da 1ª República - a mais famosa que incluiu o assassinato de António Granjo e de outras luminárias do regime - e as "Câmaras" foram dissolvidas. Às legislativas que se seguiram já Salazar não quis concorrer. Mesmo assim, ainda escreveu ao colega Lino Neto que "é quase para mim um ponto de honra (...) ir ao Parlamento". Não foi, contudo. Sabia (continua na carta) que "o mundo não nos foge": "se tiver de ser político, tenho tempo ainda de o ser e talvez mau". Um cínico, este Salazar. Sempre impiedoso com os "nossos pobres monárquicos".

ORAÇÃO DE SAPIÊNCIA

A Universidade de Coimbra prodigalizou um doutoramento honoris causa ao nosso dr. Sampaio. No acto, Sampaio manifestou-se incomodado com as permanentes mexidas na justiça. Disse que a sua suposta "reforma" é incompatível com imediatismos. E disse bem. Mas é "oração de sapiência" que Sampaio deveria ter proferido no Largo do Rato. O PS está quase ininterruptamente no poder vai para quinze anos, todos eles, com a excepção dos últimos, presididos por Sampaio. Nestes anos, o PS teve mais "políticas" para a justiça do que ministros. Nenhuma delas foi coerente com a que a antecedeu. E, na altura, Sampaio não se preocupou excessivamente com "imediatismos" ou com aquelas incoerências. O regime alimenta-se da instabilidade legislativa e da insegurança jurídica com as quais Sampaio conviveu, como PR, na perfeição. Queixa-se, agora, de quê?

O CANASTRÃO E O EVANGELISTA


Por regra, os candidatos presidenciais "crescem" do partido a que pertencem (Soares, Sampaio e Cavaco) para a nação. Alegre, porém, prefere "crescer" de outro partido - o Bloco - para o seu e só depois, eventualmente, para a eleição. Parafraseando Donald Davidson e T. S. Eliot (um poeta a sério), é um belo começo, a nice derangement of a beginning.

PORTUGAL CONTEMPORÂNEO - 3

«Apesar do palavrório e dos trémulos de voz (quem não se lembra de Guterres com o coração na boca?), o Estado nunca de facto se preocupou em educar os portugueses. Ou porque não sabia o que era a educação (coisa provável e muitas vezes manifesta no pessoal dirigente) ou porque se limitou a ceder a pressões - regionais, corporativas, económicas, partidárias - com um total desprezo pelo resultado. Neste capítulo, o grande "esforço" oficial, como eles gostavam de chamar à falcatrua, não passou na prática de puro fingimento. Não admira que estejam hoje no desemprego entre 40 e 50.000 "licenciados". Nem que a produtividade não aumente. O que admira é que ninguém perceba que Portugal fabricou a sua própria miséria: por desleixo, corrupção e militante estupidez.»

Vasco Pulido Valente, Público

23.1.10

DAS FARTURAS

Algumas pessoas deste blogue e algumas pessoas deste têm em comum a militância no mesmo partido. E dizem uns dos outros o que militantes de partidos adversários não chegam a dizer uns dos outros o que, em parte, explica o estado do partido deles. Alguém poder ser ou deixar de ser líder não devia tirar o sono a ninguém. A mim, pelo menos, não tira. Todavia gosto mais de farturas do que de políticos que pretendem começar a "carreira artística" a, tipicamente, oferecer farturas.

DON CARLO NA BASTILHA



Em Fevereiro, estreia na Ópera da Bastilha uma nova versão do Don Carlo, de Verdi, encenada por Graham Vick. Dirige Carlo Rizzi. Luciana D’Intino, que passou pelo São Carlos noutra encarnação, será a Princesa Eboli. Um pretexto para, "entre carnavais" e para sair uns dias deste carnaval, ir até Paris.

Clip: Festival de Salzburgo de 1986. Herbert von Karajan.

22.1.10

GENIAL

Prosa em três tempos sobre o tempo único alimentado por meia dúzia de farsantes.

CAVACO


Este blogue - o seu autor - é muito fustigado com coisas do género "só sabe dizer mal". É sinal de que, apesar de tudo, ainda sei dizer alguma coisa. Mas hoje concedo um elogio que não é vitupério. Cavaco Silva foi eleito Chefe de Estado há quatro anos. Depois de Eanes (atípico) e de dois socialistas, a chegada a Belém de alguém que nada devia à legitimidade militar ou à "anti-fascista" repôs algum equilíbrio no regime. A prova disto reside nos persistentes ataques que aqueles que se julgam donos do dito regime, directa ou indirectamente, lançam, alarve ou menos alarvemente. ao PR. Cavaco não "faz o género" desta gente. Não fez quando arrebatou duas maiorias absolutas, nem faz agora. A autoridade de Cavaco foi construída. Nunca foi outorgada em atestados de bom comportamento passados pelo patronato democrático ou pelos critérios de eugenia político-cultural em vigor que Pulido Valente (não o historiador mas o "admirador" de Soares) sintetizou na sentença "não ficará na história". Como escrevi na altura no falecido Independente, «a sobranceria das esquerdas acerca de tudo e de todos, particularmente em matéria de subtileza "cultural", teve a resposta que merecia.» Voltará a tê-la daqui a um ano.

Adenda: É triste a figura que um jornalista com a idade de Mário Crespo fez diante de Passos Coelho por causa do seu ódio primitivo - e inteiramente pessoal - ao PR. Ao pé de Crespo, e até pelas respostas que deu, Passos Coelho foi um senhor e ele apenas patético.

UMA HISTÓRIA DA GUERRA



Comecei a folheá-lo há pouco e ainda não o larguei propriamente. Antes - literalmente - de uma enciclopédia de História da Guerra, este livro é um poderoso ensaio filosófico. Ainda voltarei a ele, um destes dias.

tmr

NO COUNTRY FOR OLD MEN - 2


Outro dia escrevi isto. Salvo erro, nesse dia o sr. Hitchens tinha sido "recomendado" pelo betoneiro do comentarismo televisivo oficioso, o sr. Lopes. Casanova foi mais longe e infinitamente melhor. Quando há destas coisas para ler em blogues, para quê perder tempo com tremoços, i.e., com a "causa pública" e os que estão permanentemente em bicos dos pés a fazer de arrastadeiras de pretensas "gerações de mudança"? Ou, no limite, com a mediocridade da vida onde a noção do sublime se perdeu irremediavelmente?



«“Gore Vidal” foi uma convenção literária concebida por Gore Vidal para ter sempre muita razão num mundo repleto de estúpidos. A convenção, no entanto, emancipou-se muito cedo, e decidiu permitir-lhe apenas escrever muito bem num mundo repleto de pessoas que escrevem mal: escrever muito bem naquele tom patenteável de alegre e incrédula exasperação, como quem relata os disparates de um filho cretino (sendo que o filho cretino é a raça humana). O deleite na imaginação do desastre é uma pose cheia de limitações, que a longevidade tende a agravar, pois perpetua um ciclo vicioso: a pose serve para expressar uma sensibilidade literária e intelectual cuidadosamente artilhada, mas também para validar as suas manifestações, pois se ela não fosse uma consequência natural das respostas aos factos, nunca lhe permitiria escrever tão bem (isto é uma falácia na qual caíram pessoas bem melhores que nós, pelo que não vale a pena empertigarmo-nos). Com o tempo, todas as energias criativas são empregues num único propósito: evitar que a personalidade encontre os prosaicos atritos da realidade, que às vezes fazem uma pessoa (menos eu, que sou realmente infalível) mudar de ideias. Estas personalidades, esculpidas com tanto afinco, deixam por fim de ter a elasticidade suficiente para responder às necessidades, numa altura em que já não há capacidade nem paciência para explorar tácticas novas; e afundam-se no seu próprio ADN, como as pessoas de idade. Vou agora explicar-vos o segredo das pessoas de idade: as pessoas de idade envelhecem, tornam-se abruptas e inconvenientes, perdem uma fracção das maneiras e a totalidade do timing, lançam piropos a enfermeiras e dizem mal dos brasileiros, babam-se nas golas da camisa e chamam José ao Luís. O que as pessoas que ainda não são de idade fazem é ignorar tudo isto, mantendo um silêncio decoroso, porque um dia aquela pessoa de idade seremos nós, e vamos precisar da tolerância de quem nos ature. Não se aproveita a oportunidade para apontar, como quem descobre a pólvora, que o avô já não é o que era, ou para ganhar as discussões que se perderam quando as regras eram outras. A entrevista ao Independent que provocou em Hitchens aquela falsa e sórdida indignação é uma entrevista a um homem com 84 anos, que já respondeu a todas as perguntas muitas vezes, e já não se dá sequer ao trabalho de olhar para as cábulas; um homem que sobreviveu à família, aos amigos, aos inimigos, ao companheiro de toda a vida, e às suas próprias pernas; um homem que costumava saudar entrevistadores com abusos pansexuais e citações de Cícero, e que agora se limita a dizer "It is so cold in here," he says, by way of introduction. "So fucking cold". É um homem que conquistou o direito a ser este homem, e a ter frio, a ter muito frio. Confrontado com isto, Christopher Hitchens foi abrir mais janelas, porque ainda pode.»

21.1.10

"UMA MENTE GENUINAMENTE OCA"

Finalmente um retrato enxuto de Aguiar-Branco, o "boas famílias" unido por um hífen ao "bom candidato": «sempre me pareceu uma mente genuinamente oca.» A mim também.

SE

Os nossos "escritores" e candidatos a "escritores" lessem mais Nietzsche talvez percebessem por que é que nem sequer são facultativos.

EM FRANCÊS

Muda-se de canal e surge o presidente do INATEL, o honorável Ramalho do PS de Setúbal, a falar num "neocon" qualquer. "Neocon" é ele, mas em francês.

PASSOS AKA SÓCRATES



Não comi a minha sopa para ver Passos Coelho a prodigalizar para cima da D. Judite. Mais do que doer-me o estômago, dói-me a tola. Passos Coelho provoca enxaqueca porque aquilo é Sócrates sem os anos de palco que Sócrates leva. Aliás, o que Coelho diz do partido a que aspira presidir podia perfeitamente ser dito por Sócrates. Oscila entre o velho cacique da "jota" e o antigo candidato à câmara da Amadora numa gravitas que cheira a falso. Fala em "gente crescida" como se ele fosse politicamente adulto. Porém, tem medo de um congresso onde possa ler páginas do seu livro em público como qualquer autor português contemporâneo que se preze. O "contra mim" com que vê a eventual emergência de candidatos à presidência do mesmo partido é mesmo de "autor" de livro que ele é. É Passos candidato e Passos escritor a par e passo. Ele "desafia" o prof. Rebelo de Sousa como Rodrigues dos Santos "desafia" Dan Brown. Paternalista, "conhece mal" Paulo Rangel sem perceber que, provavelmente, o país já conhece esta cópia, Passos, e que, por isso, prefere o original, Sócrates, o "bom socialista" a quem dedicou dois minutos da entrevista. Quem quiser que o compre. A ele e ao livro.

O CAVAQUISMO DE SOARES

Soares não quer Alegre porque Alegre é um candidato "presidencialista" que, se fosse eleito, iria inevitavelmente secundarizar o partido. E, por tabela, acabar de vez com o "soarismo". C'est la vie en rose.

QUEM É QUE QUER CASAR COM A CAROCHINHA?

O lufa-lufa alterneiro a caminho do ministério das finanças - ora o CDS, ora o PSD - é um número circense que o país dispensava. Sobretudo porque o que está em causa é a disputa dentro da direita que o PS explora às escâncaras. Isto porque algum orçamento haverá e algum orçamento passará. É a natureza das coisas. Quer por ser tão óbvio quanto obtuso.

ERA UMA DEMOCRACIA, POR FAVOR

Hoje, ao que parece – eu não fui confirmar, nem tenciono fazê-lo – as escutas do caso Apito Dourado foram divulgadas na Internet. Como é habitual neste meio, os rastos não são cognoscíveis e o crime ficará, muito provavelmente, impune. De qualquer modo, aproveite-se o “pretexto” para falar de algo que, apesar de não receber as atenções de quem quer ou deveria querer “mudar” o país, é a base de todo o Estado.
Não é, preclaros leitores, a “igualdade” que faz as democracias. Nem tão-pouco é o “voto”, ao contrário do que muitos julgam. O que faz uma democracia é, antes de tudo, um sistema judicial que seja independente, sério e rápido. O nosso, infelizmente, não é nada disto. E o preclaro leitor bem que pode ir “votar”, bem que pode “manifestar-se”, bem que pode fazer a espargata, que sem uma Justiça que seja independente, séria e célere, todo o Estado fica num estado primitivo, inseguro e a caminho de uma situação perigosa.
Hoje foi Pinto da Costa. Provavelmente uns benfiquistas, uns sportinguistas e mais umas coisas dessas deram pulos de alegria e, no seu íntimo ou em bom som, sentem justiça feita. Não, meus caros. Isto não é justiça. E para tirar a prova dos nove, basta que o leitor se coloque naquela situação. Imagine que publicavam escutas suas num canal de vídeos na Internet – escutas com ou sem conteúdo criminal –, e tire as conclusões que tiver que tirar.
Claro que muitos dizem que este caso se pode comparar com o de José Sócrates. Não pode, de todo. O que faz com que José Sócrates tenha de prestar contas ao povo sobre os casos em que está envolvido não é o facto de sermos todos coscuvilheiros ou o de querermos justiça popular. É o facto de José Sócrates ter um cargo de confiança pública, confiança que é incompatível com “nuvens”. Pinto da Costa, ao que sei, ainda não é servente da nação. Nem Pinto da Costa, nem eu. Alguém tem de ser responsabilizado por esta situação. E com “responsabilizado”, não falo em reprimendas. Há cadeiras que têm de ficar vazias e acho muito bem que se comece de cima para baixo.

tmr

A APOTEOSE DA PLASTICINA

Logo, ao fim da tarde, ocorre uma missa de corpo presente em Alcântara promovida por uma editora e por um falso jovem político que pretende imolar-se no altar da pátria depois de tentar esfolar o do PSD. Lança, o falso jovem político, uma "autobiografia" como se tivesse uma biografia e como se, com tamanha frivolidade, comovesse o país. Como não faltam bloggers e blogues acólitos, com escribas com propensão para "Carlos Castro-depois-de-ter-lido-as-obras-completas-de-Filipa-Martins", ficaremos a saber tudo sobre o "evento". Aliás, os acólitos estão sempre atentos e, conta o Filipe, a dar a cara pelo «candidato ideal porque é jovem e não está habituado aos vícios da política.» Eles vicejam na estupidez e julgam que os outros também são estúpidos. É evidente que não se deve desconsiderar a estupidez, como ensina o prof. Cipolla, sobretudo naquele sentido em que as pessoas não estúpidas subestimam sempre o potencial nocivo das pessoas estúpidas, ou em que os não estúpidos se esquecem constantemente que, em qualquer momento, lugar e situação, associar-se com indivíduos estúpidos revela-se, infalivelmente, um erro que se paga muito caro. Mas já chega de plasticina mal amanhada.

A "LUZ", SEGUNDA PARTE OU MÁRIO CRESPO NO SEU ETERNO ULTRAMAR


«"Todos achamos...?" O Senhor Professor julga o país, pelo discurso num único sentido, a partir da cátedra. Todos achamos, uma ova. Alguns acham, acharam. A Sic e Mário Crespo desde que se emproaram em fazer PR's como dizia o Rangel, dedicam-se a estas patetices, com uma colecção de comentaristas ad nauseum, sempre com o deslumbrado MC convencido que, cada entrevista, é um contributo para um inesquecível e único registo mediático. E que todas as noites são noites históricas. O provincianismo bem português já não está, há muito tempo, na Província. Instalou-se há muito nesta saloice museológica, que viaja, mas verdadeiramente, não sai de cá, não evolui e limita-se a botar o discurso politicamente correcto.Tivesse o Obama levado com dois boeings numas torres e aí veriamos qual a "luz" que se alumiava... » (do leitor Pedro Ferreira)

RESULTADOS

Aqui.

tmr

LÓGICA DA BATATA

«Este [o desemprego] vai continuar a subir antes de descer.» Esta, a frase, é uma tirada da ministra do trabalho, uma velha assalariada da UGT que se veste pessimamente. O Almirante Américo Thomaz devia achar-lhe piada.

20.1.10

THANK


You.

PAPOILAS SALTITANTES (2)



por sugestão de um comentador.

tmr

A "LUZ"

«Todos nós achámos que vinha uma nova luz ao mundo», disse Adriano Moreira a Mário Crespo a propósito de um ano de Obama. Salazar lá se riu, de novo, deste seu antigo ministro na tumba rasa do Vimieiro. Soares não diria melhor e a RTP também não. Se eu fosse americano, teria votado Obama naquela "linha" do melhor do que não presta. Mas como não sou cego, surdo e mudo nem aspiro a ser bajulado em lado algum, parece que está a ficar razoavelmente claro que Obama é mais um presidente dos EUA e não uma "luz" qualquer. O que há de bom nos EUA, como, por exemplo, as universidades e as bibliotecas, antecede a "luz" e ficará para além da "luz". Obama é apenas mais um demagogo. Passará.

UM CONSELHO


«Uma pessoa está sempre a mudar e nunca chega a parte alguma. Mas chegar a algum lado também não é necessário. Morrer, sim. Tudo o que é inevitável é necessário.»

Paul Bowles

PAPOILAS SALTITANTES



O senhor da fotografia, ao que parece, tem «muita vontade» de voltar à «vida profissional» e até foi «sondado» para presidir a REN. Deixou de ser ministro há três ou quatro meses. Acho que nem todas as metáforas juntas, de mãos dadas, numa dança sincronizada permitiriam explicar isto de forma educada. E como sou educadinho, que sou, prefiro nem tentar. Um beijinho para o regime, que bem precisa de carícias.

tmr

A VANTAGEM DE UM PENTEADO "FOSGA-SE"


«É tão fácil pôr meia dúzia de chavões políticos simpáticos e razoavelmente consensuais em livro. Mas desengana-te Manuela, tu, mesmo que escrevesses os Lusíadas, só terias direito a 22 segundos de notícia e 15 de filmagem que, por coincidência, seriam na altura precisa em que a tua cara estava numa posição estranha.»



Adenda: Se dúvidas houvesse acerca da "obra", este must vale mais que mil palavras. Como diria o deliquescente Nicholas Sparks, são as palavras que nunca te direi.

HISTÓRIA FEITA



OBAMA E O EMPORIO


Por falar em EUA, Obama chega ao fim de um ano de presidência em baixa. Sofreu a primeira derrota doméstica com a eleição dum tal sr. Brown, republicano, para o lugar deixado vago no Senado pela morte de Ted Kennedy. Passada a "fase folclore transmontano" que ainda alimenta as fantasmagorias de alguma esquerda europeia, Obama e a sua "revolução" começam fatalmente a ir ao lugar. A velha história da saúde é um sinal. Clinton também acabou derrotado por esse emporio ao pé do qual as indústrias congéneres nacionais andam de fraldinhas. O sr. Brown ameça virar o "plano de saúde" de Obama ao contrário por causa dos votos. Isto é, no sentido em que ele sempre esteve, nas mãos das seguradoras rapaces. É o "born in the USA" onde todos os Obamas do mundo não cabem.

UM BLOGUE

O José Gomes André e o Nuno Gouveia reabrem, agora em parceria, o Era uma vez na América. Basicamente estão ali os dois bloggers portugueses com as melhores análises sobre política americana, análises que não se resumem a ler a secção mundo de um «jornal de referência» luso. É visitar, que só se fica a ganhar.

tmr

19.1.10

A BOA APOSTA


Fora a defesa do "presidencialismo de chanceler" - ou seja, da predominância do "parlamentar" no "semi" que constitui o regime e que o conduziu ao belo estado em que se encontra -, esta é uma entrevista serena de Santana Lopes. É da fisiologia do PSD os congressos. Sem congressos, os partidos "albanizaram-se" e aquilo a que apelidam de "congressos" transformaram-se em meras cerimónias patéticas de consagração do ungido, sem o menor interesse para a opinião pública. E Lopes percebeu que é por aí que se recomeça. Ganhou a aposta.

O LIVRO POR VIR

Para quem se prepara para editar Passos Coelho em livro (outros "editam-no" de outra maneira), para quê uma pergunta destas?

VICO REVISTO POR LOMBA


Este argumento de Pedro Lomba lembra, em caricatura doméstica do regime, Vico. Vico via a história como a sucessão entre três fases essenciais - a teocrática, a aristocrática ou heróica e a democrática - em que à ultima (tipicamente a democrática) se seguia um período caótico por causa da corrupção, voltando tudo, depois, ao momento teocrático por um processo que Vico designava por "ricorso". E assim sucessivamente. Lomba acha que, dissolvidos durante 36 anos entre "históricos", "professores", "discípulos" e "chefes de partido", os portugueses suspiram pela "quinta dinastia do regime" que "deverá ser portadora de outra autoridade". "Alguém - diz Lomba - que, depois dos manobristas partidários, seja representativo e reconhecido, não pelo partido, mas sobretudo pela sociedade." Lomba fala como um marciano que julga que em Portugal existe uma coisa chamada "sociedade civil" da qual brotará, qual cogumelo saudável, a salvação. Engana-se. Visto de trás para diante, o movimento "dinástico" de Lomba verdadeiramente nunca saiu da quarta fase, a dos "chefes de partido". Até Cavaco e Eanes, as personalidades mais visceralmente alérgicas a partidos, tiveram respectivamente de presidir a um e de instituir outro. Bem, no caso de Cavaco, muito mal no caso de Eanes. Soares, Freitas e Sá Carneiro fundaram partidos e todos "cresceram" dos partidos para a nação. Os "discípulos" só se "realizaram" quando tomaram conta dos despojos partidários dos Pais fundadores. E a mais recente abrótia, Passos Coelho, não vê a hora de tomar conta de um apesar de andar (teoricamente) a pastar pela "sociedade" há uns anos depois de devidamente "formado" no pior aparelhismo. Este regime não possui verdadeiros senadores nem elites. Tem apenas gente mais nova ou mais velha fornecida pelas máquinas partidárias, nascessem elas na Alemanha ou numa obscura rua de Lisboa. Por isso, pedir à "sociedade" que imole um dos seus no altar da Pátria equivale a pedir a Mário Soares que se "desrepublicanize" ou a Sócrates que concorra a um emprego. A fase democrática de Vico tem este efeito perverso num regime que começou com cravos. Nenhuma narrativa verosímil se pode escrever a partir de uma revolução folclórica e florista. De Gaulle ressumava uma autoridade indisputável forjada numa guerra a sério. Só isso permitiu que, mais de doze anos depois do fim das hostilidades, a França caísse literalmente a seus pés num "ricorso" irrepetível que juntou teocracia, aristocracia e democracia num lance único. E o partido só veio depois do caos. Ora uma nação de frouxos só pode gerar mais frouxos e "dinastias" de frouxos mais frouxos ainda. Uma sociedade timorata, como a nossa, teme o caos em vez de o desejar. Salazar não se enganava acerca do "viver habitualmente" o que, em "democratês", quer dizer partidos e respectivo pessoal. Essas são as elites, essas são as dinastias e são só elas que são "representativas e reconhecidas" porque não permitem outras. Não há "ricorso" possível.

A DENGOSA


Como se previa, o CDS do dr. Portas, depois de se apanhar com uns votinhos a mais, anda a comportar-se como a dengosa da República. "Ameaça" o PS, "ameaça" o PSD e, finalmente, permite que o dr. Nuno Melo, no PE, discuta assuntos domésticos a pretexto do dr. Constâncio não se apercebendo que é ele quem sai mal na fotografia e não o dr. Constâncio. O CDS do dr. Portas, ao contrário do que imagina, não tem "músculo" para tanta aventura e inconsequência oportunista. Sócrates não lhe agradece tanta dor de joelho. E a direita também não. Nunca há bom vento para quem não conhece o seu porto.

SIMBOLOGIA


O Chefe de Estado foi ao Oeste falar com pequenos e médios agricultores bastamente prejudicados com o mini-ciclone de Dezembro. O primeiro-ministro esteve para ir e nunca foi, enviando o ministro da agricultura e "técnicos". Não há comparação possível entre o que aconteceu no Oeste português e o que se passa no Haiti. Todavia, a política comporta a grandeza dos gestos simbólicos (como ensinou Mitterrand) sob pena de nem sequer valer a pena. Algo que, por exemplo, uma criatura como Sócrates jamais poderá entender. À sua relativa medida, gestos como os de Cavaco, em Portugal, e dos Presidentes Clinton e W. Bush no Haiti.

AVALIAÇÕES

O capitalismo selvagem dos Estados Unidos, mais uma vez, demonstrou ser bem menos selvagem que o sítio em que vivemos. Deparados com uma situação de catástrofe no estrangeiro, três senhores, três tipos que lideram ou já lideraram o mundo, decidiram, no meio das suas agendas ocupadas, dirigir os esforços de ajuda humanitária. E dirigem os esforços de verdadeira ajuda humanitária, recolhendo as ajudas que cada um está disposto a dar. Chama-se solidariedade a isto, coisa bem diferente da «solidariedade» europeia.
Por cá, na nossa bem-amada pátria, cheia de Estado Social que é bom, deparados com uma pequena catástrofe na zona Oeste que destruiu investimentos de uma vida, apenas tivemos «preocupações» e pedidos de «apoios», que, ao contrário dos do parágrafo anterior, foram pedidos (e dados) pelo governo e pelos municípios. Não dei por quem tivesse criado um fundo para que o comum português pudesse ajudar, não dei por o dr. Sampaio, o dr. Mário Soares ou o general Eanes a liderarem o que quer que seja e do actual Presidente apenas ouvi a mesma velha «preocupação».
Enquanto o socialismo europeu cospe na barbárie americana, continua a levar lições e lições. Nenhum país do mundo é perfeito, mas uns são melhores que outros. E é nestas pequenas grandes coisas que os podemos avaliar.

tmr

18.1.10

O SR. ERC, SEGUNDA PARTE

A conversa de Mário Crespo com o sr. ERC, o prof. Lopes, denota que há um sr. ERC até 27 de Setembro de 2009 e um sr. ERC - este, que zurze interminavelmente no jornalista Zé Alberto Carvalho, director de informação da RTP - que emergiu depois de 27 de Setembro de 2009.

DOS MENORES AOS PEQUENINOS

Entre gente menor, que não conta, e "elites" mencionáveis e simultaneamente preenchidas com muitos menores e gente decente, eis que um exercício menor de copy/paste dá voz à massa bruta entre preços caros de restaurantes e coisinhas assim. Tudo somado, não podia ser de outra maneira.

CESSPOOL

Aqui fala-se em "descavaquizar o PSD", leia-se, em "passoscoelhizar" o PSD e em ajudar Sócrates. Esta gente que se diz de direita, mas que é pura freteira indirecta do regime, vive de esbracejar na sua privativa cesspool à espera, como na delicada piscina de Madame de Stäel, que os pesquem. Ainda morrem afogados.

DEAR WORLD


Na semana passada estreou um musical, em Frankfurt, sobre Barack Obama. Tem um nome tão pornográfico quanto "Hope - The Obama Musical History". O propósito de tal ocorrência é, segundo disse a imprensa, o facto da sua candidatura de 2008 ter proporcionado uma avalanche de "esperança num mundo melhor". A infantilização do mundo ganha terreno a cada instante e o produto medíocre dá dinheiro à bovinidade do Homem. A esperança não se mede com os Obamas desta vida. Com pretos no poder, gays casados, mulheres nos cargos de decisão, espécies animais com direitos tão regulamentados quanto os homens, políticas improfícuas e mentirosas de combate ao aquecimento global e por aí em diante, a dramaturgia da vida não anda um átomo para o lado e, por conseguinte, não varia um só bocadinho o Drama do Homem. Tudo isto é alimentação de mitos clássicos ou modernos e preconceitos batidos e o oposto do que toda essa gente que é tida como "à frente" anda a gritar. Apesar de parecer, nem os figurinos mudam. De resto, animar-se com um Obama ou com alguma coisa que a ele corresponda simbolicamente, que é o mesmo que olhar para o imediato e para o próprio umbigo sem perceber o óbvio, é próprio de quem anda por aqui a arrastar-se.

PESSOAS BOAS

Sabe bem chegar à Baixa e encontrar pessoas como o Torquato da Luz - um jornalista de tempos em que havia jornalistas e não meras regateiras ensimesmadas e broncas - e, no café, o conselheiro Souto Moura, tão injustiçado pela insustentável leveza das apreciações superficiais. As minhas incluídas. E que fina ironia a sua. Eu que nem gosto do Régio, gosto destas "ironias e cansaços" que só o decurso do tempo e a respectiva filtragem das pessoas trazem. Isto é para não dizerem em programas radiofónicos que só "insulto". Ora não insulto. Limito-me a descrever alguma gente tal qual ela é. Foi o que fiz agora.

17.1.10

OUTRO SINTOMA


Do «reaccionarismo e do provincianismo que imperam no mundo dos jornalistas». E do reaccionarismo e do provincianismo que imperam no mundo dos blogues que se imaginam "tutelares" só porque um ou outro mabeco que lá escreve também bolça nos jornais e nas televisões.

UM SINTOMA

Para além da peripécia do regresso do avião, a missão portuguesa no Haiti é um sintoma. O que se discute é por que é que foram uns em vez de outros. Tudo por causa de sete miseráveis dias e de meia dúzia de pessoas. Um sintoma, de facto.

BATATAS E NOIVAS


A pseudo polémica em torno do não assunto das "noivas de Santo António" parece dar razão àqueles, como eu, que sempre acharam que a imagem relevava mais do que a substância. As "noivas" foram uma criação do Estado Novo e o Estado Presente (uma inovação terminológica de Medina Carreira) quer apropriar-se dela para a propaganda tal qual o primeiro daqueles Estados. Lá onde as "noivas" se destinavam a satisfazer um princípio de caridade caro ao regime - os casais eram invariavelmente de origem social "baixa" -, agora, em nome do folclore ideológico chique que só se "casa" no Lux, as respectivas parcas já começaram a zurzir as canelas do edil de Lisboa, dado que as mordidelas na Igreja fazem, por natureza, parte do manual destes prosélitos. Vão cavar batatas.

BEM OBSERVADO

Aqui.

SANTO ANTÓNIO

Sobre os casamentos de Santo António aos quais os homossexuais não podem aceder, parece-me que há interessantes análises a fazer. Em primeiro lugar, deixem-me dizer que imagino, com a minha mente traquinas, o que seria se fosse Pedro Santana Lopes e não António Costa a vedar o acesso dos casais homossexuais a uma celebração que se destina a pessoas que querem casar pela Igreja, pelo Civil e até, pasmem-se, em Mesquitas. A mim parece-me que o Santo António certamente toleraria mais o seu nome usado numa celebração de casais homossexuais que numa de casais muçulmanos, mas isto sou eu a especular sobre desejos de santos – prática a que me dedico nas horas mortas. Já António Costa, co-fundador disso da «Esquerda Moderada e Moderna», parece muito incomodado com o assunto. Também a Igreja me parece assumir uma postura bastante hipócrita: casamentos de Infiéis (com maiúscula), apoia, mas casamentos de sodomitas já não – que morram em enxofre.
No meio de tudo isto temos, claro, aqueles que estariam em cima de contentores a gritar no meio do Rossio, mas que não o fazem, a bem do Partido (com maiúscula, também).
Que Santo António os abençoe, caso lhe apeteça.

tmr

RECONSTRUÇÕES

Sempre que há uma catástrofe, surgem alguns iluminados com o discurso da regeneração. Que não há nada melhor para que um país, uma cidade ou até mesmo, julgo, uma família que uma desgraça colossal, a ver se todos acordam. Claro que isto é um racionalismo que deveria ter cuidado com o excesso de peso, devido ao facto de estar demasiado tempo recostado no sofá e apenas dar mostras de movimento quando se choca durante os trinta segundos da notícia catastrófica. Não me quero apresentar como moralista: eu nunca, felizmente, vi directamente os estragos de uma catástrofe, natural ou outra. Mas a verdade é que este discurso é absurdo «a mais», digamos assim. É preciso demasiado cinismo para que se olhe para um desastre que ceifa centenas de milhar de vidas com os embaciados olhos de quem só pensa no «desenvolvimento», no «crescimento» e no «progresso». Pergunte-se aos haitianos o que preferiam eles, se um progresso tremendo devido ao terramoto, com um grau de certeza bastante discutível, ou nenhum terramoto at all. Eles responderiam nos termos correctos, quer me parecer.

post inspirado numa conversa com o Hélder, no twitter.

tmr

PORTUGAL CONTEMPORÂNEO E A NECESSIDADE DE OUTRA COISA


«Na balbúrdia estabelecida, há uma única personagem em quem até certo ponto os portugueses confiam: Cavaco. Manuel Alegre não se enganou. A opinião, essa opinião que as sondagens nunca reflectem, é marcadamente antiparlamentarista e antipartidária. No que ele se engana é em atribuir esta perversidade só à direita. Ele mesmo, com a sua independência do PS e as suas relações com o PC e o Bloco, prova o contrário. A candidatura que anunciou no Algarve não é uma candidatura da esquerda, é uma candidatura acima da esquerda, a candidatura da gente desiludida com os partidos, que procura uma nova solução, ou seja, como a de Cavaco, com uma lógica presidencialista. O que, no fundo, Manuel Alegre sabe muito bem. Portugal inteiro suspira por outra coisa.»

Vasco Pulido Valente, Público

Comentário: O anti-presidencialismo manifestado por Alegre na terra do pobre Teixeira Gomes é puramente retórico. Teve, porém, um efeito imediato. Algumas harpias do pior PS (o do "socratismo dos últimos dias") já vieram sugerir a "divisão", ou seja, a necessidade de um candidato "deles" que os defenda e, no limite, mantenha esta coisa a caminho de lado nenhum que é este regime semi tudo e semi nada.

16.1.10

DISPONIBILIDADES



«Manuel Alegre diz-se "disponível" para ser Presidente da República. Só falta saber se os portugueses estão disponíveis para o aceitar.» [Continuar a ler]

NOITE


Tony Judt - cujos livros sobre o século passado foram traduzidos recentemente - sofre de uma doença do foro neurológico, degenerativa, apelidada de "doença de Lou Gehrig". Este texto é a primeira de uma série de reflexões de Judt a pretexto e acerca da sua doença. É cruel mas é um belíssimo escrito sobre a precariedade disto tudo, a noite definitiva que praticamente nunca ninguém vê vir.

«The best way to survive the night would be to treat it like the day. If I could find people who had nothing better to do than talk to me all night about something sufficiently diverting to keep us both awake, I would search them out. But one is also and always aware in this disease of the necessary normalcy of other people's lives: their need for exercise, entertainment, and sleep. And so my nights superficially resemble those of other people. I prepare for bed; I go to bed; I get up (or, rather, am got up). But the bit between is, like the disease itself, incommunicable. I suppose I should be at least mildly satisfied to know that I have found within myself the sort of survival mechanism that most normal people only read about in accounts of natural disasters or isolation cells. And it is true that this disease has its enabling dimension: thanks to my inability to take notes or prepare them, my memory—already quite good—has improved considerably, with the help of techniques adapted from the "memory palace" so intriguingly depicted by Jonathan Spence. But the satisfactions of compensation are notoriously fleeting.There is no saving grace in being confined to an iron suit, cold and unforgiving. The pleasures of mental agility are much overstated, inevitably—as it now appears to me—by those not exclusively dependent upon them. Much the same can be said of well-meaning encouragements to find nonphysical compensations for physical inadequacy. That way lies futility. Loss is loss, and nothing is gained by calling it by a nicer name. My nights are intriguing; but I could do without them.»

CAPACHOS

O PS tem um batalhão de lacaios, uns mais sofisticados do que outros, a escrever em jornais, a debitar nas televisões, a palrar nas rádios e a alimentar blogues e redes sociais. Apesar de ter perdido a maioria absoluta, a "acção comunicacional" política é dominada pelo PS e pelo governo de uma forma de tal modo profissionalizada que, quando é preciso, nem os "seus" (aqueles, poucos, que ainda exibem uma cabeça erguida acima dos ombros) escapam. Pois um simples artigo de jornal escrito por um assessor da casa civil de Belém foi o suficiente para pôr a matilha em campo como se a liberdade de expressão tivesse donos e exclusivos. Tudo isto acontece porque estes novos fascistas, quando a coisa acabar, regressarão ao justo anonimato de onde nunca deviam ter saído ou esperarão para se colocar de cócoras perante novos "donos" porque é disso que vivem. Capachos uma vez, capachos para sempre.

ALEGRE ENQUANTO METONÍMIA


Medeiros Ferreira, em 2004, apoiou Manuel Alegre dentro do PS contra Sócrates e o irrelevante Joãozinho. Em 2006, apoiou Soares contra Alegre e Cavaco na corrida a Belém. Por isso, sabe do que fala. «Alegre corre para a situação de Soares (de 2006), i. e., «a candidatura de Manuel Alegre em 2006 foi uma candidatura de protesto, papel que lhe ia a matar. Desta vez Alegre corre para ter o apoio institucional de Sócrates à presidência. É uma transfiguração de monta.»

RETRATO DE UM VELHO POLÍTICO PORTUGUÊS

«Um partido que se mostra disposto, por exemplo, a concentrar as suas expectativas e esperanças em Pedro Passos de Coelho só pode viver à beira do desespero. Sem querer retirar méritos ao antigo líder da JSD, a verdade é que o que tem apresentado, dito e defendido publicamente quanto ao futuro de Portugal soa a velho, cheirando ao mofo adquirido pelos sapatos que, há muito, se habituaram a percorrer os corredores do situacionismo nacional, o mesmo que colocou o País no estado em que mergulhou.»

José Eduardo Moniz, CM

PORTUGAL CONTEMPORÂNEO - 2

«Em S. Bento, os partidos trocam gravemente um imposto por outro, aumentam aqui e diminuem ali e cada um procura sair com alguma coisa, por pouco que seja, que sirva o seu particular interesse e segure o seu voto. Apesar do que por aí se proclama em contrário, o Orçamento, para eles, não é um instrumento para reformar e reorientar o país. No fundo, como se verá, não passa de uma engenhoca eleitoral e de um álibi para agências de rating. Nem a Assembleia, nem o Presidente se perguntam por que razão Portugal recaiu no velho vício do endividamento externo e interno, que lentamente corrompeu a Monarquia Liberal e liquidou à nascença a I República. E se por milagre se perguntassem, não sabiam responder. Discutir o Orçamento - e, pior ainda, segundo consta, um plano a longo prazo para "solidificar" as finanças públicas - sem uma palavra sobre a administração central e local, sobre a corrupção, sobre a justiça e, principalmente, sobre a eficácia e papel do Estado Providência, é um absurdo. As "vozes do derrotismo" são hoje, infelizmente, a "voz da realidade". Cassandra, afinal, não se enganou.»

Vasco Pulido Valente, Público